A VERDADE NÃO SERIA BASTANTE PLAUSÍVEL SE FOSSE FICÇÃO - Richard Bach
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sábado, 16 de maio de 2020

Ricardo Divilla, o cérebro da equipe Copersucar-Fittipaldi.



No dia 25 de abril de 2020, perdemos um dos maiores projetistas de carros de corrida do Brasil, Ricardo Divilla morreu na França, longe do seu Brasil, por quem ele fez tanto.Não tive a felicidade de conversar com ele, só o vi nos testes dos carros da Copersucar, e no GP do Brasil na estréia do carro em terras tupiniquim. Já não era o FD01, e sim o FD02, o que o Ricardo nunca concordou com a nomenclatura, para ele deveria ser FD01, FD01A e FD01B, pois o chassi era o mesmo. Era uma quinta-feira, e os carros ainda estavam sendo montados, e, rato de boxes que era, estava eu lá, olhando uma McLaren, quando o Ricardo entrou nos boxes, se agachou ao lado do carro, olhou para os dois lados e colocou a mão embaixo do carro, medindo a altura do piso até o carro com os dedos. Achei estranho e engraçado ao mesmo tempo e fui atrás dele até o box da Fittipaldi, e ele fez o mesmo no FD02, e logo depois, falou com os mecânicos que imediatamente, começaram a mexer na suspensão do carro. Na F1, qualquer arma é valida para se andar mais rápido, e, se ele só tinha os dedos para usar, esta valendo.
Formado em engenharia aeronáutica, esteve junto com os irmãos Fittipaldi desde a criação do Fusca bi-motor, um carro projetado por ele para andar junto com os Fords GT40 e as Lolas T70, era um carro interessante e muito rápido, mas quebrava demais e foi abandonado. Divilla também fez alterações no Lotus 69 F2 do Emerson, e no Porsche 917 do Wilsinho, colocando sua marca registrada nos dois, um aerofólio dianteiro suspenso, que mais tarde, também foi usado tanto no FD01, como no FD04 na F1.

O FD01 é considerado por muitos como o carro mais bonito já construído na F1, e eu concordo. Tanto que na Argentina, Colin Chapman, ficou por mais de 20 minutos rodeando e observando o carro. E muitas das inovações, são usadas até hoje, como o motor carenado. Porem, não há duvidas que era um carro problemático, tanto que só correu uma vez na Argentina. Ingo Hoffmann me disse certa vez no “mensager”, que um dos problemas, era a suspensão dianteira que não chegava a altura ideal, e que isso foi resolvido no FD02. Outro grande problema era a altura do piloto em relação à visibilidade, Wilsinho treinou em Interlagos, pista que ele conhecia como poucos, mas, quando chegou na Argentina, não conseguia ver os pontos de tangencias, e o que tirava preciosos segundos. Outro problema era a refrigeração, pois os radiadores traseiros não funcionavam a contento, Li em algum lugar, que o ar frio chegava aos radiadores, mas por um fator que só a física pode explicar, não conseguiam sair pela traseira do carro. Acho que um dos maiores erros, foi não ter mantido o FD01 ao menos em Interlagos, pois seria uma ótima propaganda em uma pista que a equipe conhecia bem. Mas, enfim, o belo FD01, durou somente uma corrida.

Quando Divilla entregou o projeto do FD04 para o Wilsinho, disse: “Aqui esta tudo que sei sobre F1, daqui para frente, eu não posso fazer mais nada”. Mas o FD04, era um projeto espetacular, com algumas inovações, como as placas que fixavam as suspensões no chassi, que poderiam ser mudadas caso houvesse alterações na sua geometria. O carro era tão bom, que o Emerson ficou muito entusiasmado com o desempenho nos testes em Interlagos, e, teoricamente, se andasse bem em Interlagos, andaria bem em todas as pistas, o que é um fato. No GP de 1976, Emerson se classificou para a largada em 5º, e poderia ter sido o 3º, se não fosse atrapalhado pela Ferrari do Clay, segundo a lenda. Mas o mais estranho foi a Cosworth, que nunca tinha ajudado em nada a equipe, oferecer um motor zero para o Emerson largar, e lógico, foi aceito pelo Wilsinho, resultado, Emerson saiu da curva um em terceiro, e iria engolir os dois da frente quando, no meio do retão, o motor começou a falhar e o carro foi perdendo posições e terminou em 13º  Em 1976, o carro marcou apenas 3 pontos terminando o  campeonato, em 11º lugar, já em 1977, apesar de correr somente seis provas, o carro andou melhor, conseguindo dois 4º lugares e um 5º, e depois foi substituído pelo F5. Mas o FD04, nunca foi um carro de ponta como Emerson imaginava.Ai veio o horrível F05 de David Baldwin, um carro feio, lento e com soluções duvidosas. Não teve jeito, junto com o projetista Giacomo Caliri, Divilla alterou o projeto e fez o F5A, que por mim, deveria se chamar FD5A, e acho que foi o melhor carro da equipe, conseguindo em 1978 o tão festejado o 2º lugar no GP do Brasil.

No final de 1978, a equipe Copersucar-Fittipaldi, apresenta o belo F6, projetado pelo Ralph Bellamy, que logo no primeiro teste, após três volta, se mostrou um carro muito ruim com um serio problema de torção do chassi, e mais uma vez, Ricardo Divila junto com Giacomo Caliri foram chamados para tentar o milagre de fazer o carro andar, surgindo assim, o F6A, mas infelizmente, nem sempre o milagre acontece, e o carro nunca chegou a ser competitivo. 

Ricardo voltou a ser o projetista da equipe em 1982 com o modelo F9, junto com Tim Wringht. Um carro muito bonito e bem feito, e segundo Wilson Fittipaldi, o melhor carro que eles construíram (ele fala isso no documentário “A Era dos Campeões”), mas a equipe já não tinha bons patrocinadores e o carro não foi devidamente desenvolvido, e a equipe fechou no final de 1982.

Ricardo Divila trabalhou também nas equipes Ligier, Life, Fondmetal e Prost. Foi técnico graduado na Nissan e colaborador da Equipe Pescarolo da Le Mans na categoria LMP2.Sem duvidas, Ricardo tem um currículo invejável, e com certeza muita historia. Nos últimos anos, novamente junto com Wilson Fittipaldi, era diretor técnico da nova Formula Vee e estava para lançar a Formula 4 brasileira.

Divila é o que chamamos hoje de NERD. Uma vez ele disse que estava sempre lendo alguma coisa, e se não estivesse com um livro por perto, lia os rótulos dos refrigerantes, pois sempre havia algo a aprender. O Brasil perdeu um personagem histórico, mas não haverá nenhum documentário feito pela TV, pois no Brasil os nossos grandes personagens não tem valor se não estiver com uma bola no pé. É uma pena.

Mario Souto Maior

Agradecimento especial a Ararê Novaes, que gentilmente nos cedeu as ilustrações. 



segunda-feira, 29 de abril de 2019

Marazzi e o Porsche 917 do Wilsinho. Conta Cuca


No final de 1974, o Expedito já sabia que o Wilsinho Fittipaldi iria montar  uma equipe brasileira para disputar o Mundial de Formula 1 com o seu próprio carro. Marazzi, foi uns do primeiros entusiastas do projeto. Dizia-me ele, que com um bom chassis, um motor Cosworth e pneus Goodyear, a equipe poderia ter sucesso. E ele não estava errado, pois era a época dos kit-cars, só não contava com que os ingleses, fariam tudo para o Copersucar-Fittipaldi não andar na frente dos carros deles. E fizeram. Mas esse é assunto para outro texto.  

         O Expedito, escreveu diversas matérias, sempre defendendo o projeto, enquanto os "especialistas", só o detonavam. Porem, o Wilsinho, que adorava as matérias dele, o chamou, e disse que o Marazzi, era muito importante para divulgar positivamente a equipe, e que, ele era o único jornalista automobilismo, que tinha habilidades para testar o FD01. O Expedito ficou muito orgulhoso, e, a bem da verdade, muito entusiasmado com o convite. Ele foi até a minha casa para conversar com meu pai sobre o convite, afinal, não era para qualquer um ser convidado para testar um F1 de um grande projeto brasileiro. Na época do convite, o carro ainda estava na prancheta de desenhos. Passaram-se meses até o carro ficar pronto e o Wilsinho ligar para o Marazzi e dar a triste noticia. Infelizmente, a Copersucar vetou o teste pois achavam que o Expedito poderia destruir o carro, o que na minha opinião, até faz sentido, mas, quem conheceu o Expedito, sabia que ele jamais andaria acima do seu limite e responsabilidade. Como premio de "consolação", o Wilsinho ofereceu o Brabham BT34 para ele testar, triste e contrariado, mas vendo a possibilidade de pilotar um F1 pela primeira vez, ele aceitou.

        
         Dias depois, o teste da Brabham foi realizado. Marazzi, foi para a oficina da Copersucar, e estava conversando com o Wilsinho, quando chegou o Emerson com o Porsche 917, o doido do usava o carro como carro de rua. Expedito então, perguntou se ele não poderia testar o 917 também. Wilsinho disse que sim, mas em outro dia.
         Naquele dia, eu estava esperando o Marazzi na casa dele para saber como foi pilotar um F1? Resposta dele:
-Nada demais, nada assustador. tem acelerador, cambio freio, mas achei que seria muito mais rápido...
         Aqui, vale uma adendo: com certeza o Brabham não estava com a potencia máxima. Nem sei se este teste foi publicado na revista Manchete. Mas com o Porsche, a coisa foi diferente.
         Algumas semanas depois, foi marcado o teste com o  Porsche, e esse saiu na revista Manchete. Pouco depois, perguntei como andava o Porsche?
Respostas dele:
-Eu nunca vi o retão acabar tão rápido, foi impressionante...
-Vocês que estão acostumados a entrar na curva do Sol de pé em baixo, é porque nunca pilotaram um 917. Você chega tão rápido no final da reta oposta, que você tem que frear, reduzir uma marcha e entrar acelerando...
-Foi o carro mais rápido que dirigi na minha vida...
         Esta no texto da matéria da Manchete, que ele pediu para o fotografo ir para a curva do laranja, para fazer umas fotos mais emocionantes, pois ele ia "entortar" o carro... Duas ou três voltas depois, o fotografo começa a abrir os braços reclamando... Marazzi para depois do Laranja, desce e diz para o fotografo:
-Não adianta, o carro é muito bom, toda vez que eu tento jogar a traseira, ele me responde malcriadamente e coloca a traseira no lugar...

         Sempre que tentei conversar com o Marazzi sobre  teste do F1, ele sempre falava que era um carro comum, mas que o Porsche 917 do Wilsinho era absurdo. E eu acredito nele.
         Lembro-me, do primeiro GP oficial de F1 no Brasil. Fui aos treinos do primeiro dia com meu irmão Marco Souto Maior. Quando voltamos, o Expedito estava chegando do autódromo também na porta da sua casa (éramos vizinhos)... Paramos o carro ao seu lado, e descemos para conversar:
-E ai Expedito, o que achou?
-Nada demais, não são o super heróis que eu imaginava. Se me derem um carro daquele, e um tempo para treinar, ando junto com eles. Não digo na frente, pelo amor de Deus, mas, ficar próximo deles, eu fico. O único que me impressionou realmente. foi o tal do Tom Price. Aquele tira leite da pedra do carro...
Engraçado, eu achei a mesma coisa...
Forte abraço a todos...

Mario Souto Maior

quinta-feira, 22 de julho de 2010

A história das berlinetas Interlagos


As berlinetas Interlagos marcaram época no automobilismo de competição brasileiro, no período de 1962 a 1967, enquanto foram fabricadas e durante o tempo em que existiu o departamento de competições da Willys Overland do Brasil, que reuniu equipe de pilotos de ponta formada por Wilson e Emerson Fittipaldi, Luiz Pereira Bueno, Bird Clemente, Luiz Carlos Pace, Francisco Lameirão e Carol Figueiredo, sob o comando de Luiz Grecco. Fabricadas com base no automóvel francês Alpine, as berlinetas eram leves, ágeis e velozes, além de bonitas e muito caras para o bolso do cidadão comum brasileiro.

Apesar de que o motor que as equipava não era de grande potência, quando preparadas para competição, na própria fábrica, tornavam-se quase imbatíveis sobretudo em circuitos fechados.

Foram inúmeras as vitórias obtidas por aquela equipe, no Brasil e no exterior, em provas de curta e de longa duração, inclusive quando ainda competiam as últimas carreteiras com motores infinitamente superiores em potência.


Após a extinção da equipe, os carros de competição da Willys Overland, entre eles 4 Interlagos, 2 Gordini 1.000cc e 2 Gordini 1.093cc, foram transferidos à Transparaná, empresa revendedora da marca com sede em Londrina/PR e por aqui correram por algum tempo ainda.

Tanto é assim que, a prova de inauguração da Rodovia do Café - Curitiba/Londrina - 802 quilômetros, foi vencida por uma berlineta pilotada por Ettore Onesti Beppe, que fez média horária de 151 km, chegando em segundo Ângelo Cunha (Laranjeiras do Sul) com carreteira Ford V8 (estava em primeiro, na volta, derrapou e saiu da estrada).

Uma das berlinetas da equipe, totalmente restaurada, repousa hoje na sala de visitas da casa do empresário curitibano Glaucio Geara.

Em outras duas oportunidades escrevemos aqui sobre o estilista espanhol Jesus Ibarzo Martinez, um dos responsáveis pelo projeto do protótipo Interlagos 1966, com muitos itens diferentes do carro brasileiro original no tocante à altura de para-brisas e vidros, painel, volante, bancos, espaço interno, para-choques, lanternas, faróis, capô traseiro e parte frontal e que seria apresentado no Salão do Automóvel/SP naquele ano.

Aos 83 anos de idade, o senhor Jesus reside na cidade de Itajaí-SC e forneceu-nos valiosas informações sobre sua vida profissional desde a Espanha e sobre as atividades do departamento de competições da Willys Overland do Brasil, incluindo foto do citado protótipo que mostramos hoje aos aficionados da berlineta Interlagos, além da foto da berlineta de competição (47) daquele empresário.

Agradeço ao amigo jornalista curitibano Ari Moro a parceria neste artigo, que foi publicado no jornal O Estado do Paraná no caderno especial Jornal do Automóvel de Curitiba