A VERDADE NÃO SERIA BASTANTE PLAUSÍVEL SE FOSSE FICÇÃO - Richard Bach
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domingo, 13 de julho de 2014

Conta Ricardo!

FORMULA 1
 Mercedes deverá remover FRIC antes do GP da Alemanha

Artigo técnico: suspensão FRIC-10-07-2014

Na iminência de ser considerado ilegal pela FIA, o sistema de suspensão FRIC (Front-and-Rear InterConnected) pode ser um dos principais segredos do sucesso dentro de alguns monolugares, como os Mercedes. Hoje, no VAVEL.com, explicamos a importância e funcionamento deste sistema face a uma suspensão convencional. (Hugo Picado de Almeida)

HUGO PICADO DE ALMEIDA

Esquema do sistema FRIC na frente dos Mercedes (Desenho: Giorgio Piola).

Ontem, a FIA emitiu um aviso ao pelotão da F1: o sistema FRIC (Front-and-Rear InterConnected), abordagem à suspensão dos monolugares que liga a sua componente dianteira à traseira, assim como ambos os lados dos eixos, utilizada por algumas das equipas poderá ser banida, com efeitos já no GP da Alemanha, no fim-de-semana de 18 a 20 de Julho.
À beira da ilegalidade
O comunicado de Charlie Whiting, director de corrida da FIA, anuncia que o sistema FRIC da maioria das escuderias em competição poderá ser considerado ilegal. Isto porque tais sistemas poderão estar a infringir o artigo 3.15. dos regulamentos técnicos da F1, onde se afirma que qualquer peça que afecte a aerodinâmica dos monolugares deve estar «rigidamente fixa» à carroçaria, e o entendimento da FIA será que os sistemas FRICS, nomeadamente o de equipas como a Mercedes, não respeita este critério, por emular o comportamento de uma suspensão activa (embora sem componentes electrónicos), algo proibido na F1 desde os anos 90.

Pormenor do sistema FRIC dentro do nariz do Mercedes (Foto: in Potenza Blog).

O que é, afinal, o sistema FRIC? E para que serve?

Longe de ser uma denominação oficial, o termo FRIC designa uma suspensão em que as suas várias partes ("front-and-rear") estão ligadas por meio de sistemas hidráulicos e, por isso, se comportam em estreita relação e reacção às forças aplicadas a cada uma das suas partes, quer entre esquerda e direita quer entre eixos -- frontal e traseiro. Esta será a inovação da Mercedes, uma vez que já várias equipas utilizam sistemas análogos desde 2008, mas geralmente afectando apenas um eixo.

Observemos alguns exemplos para tornar mais claro o funcionamento deste sistema:

Situação 1: carro em momento de travagem. O peso transfere-se para o eixo frontal e a asa dianteira aproxima-se do chão (VAVEL).
Situação 1: Imaginemos um piloto que vinha a acelerar numa recta. Ao abordar uma curva (digamos, à esquerda), o piloto pisa o travão. Isto faz com que o carro se balanceie para a frente, aproximando o nariz do chão (esta diferença ascendente ou descendente, entre a frente e a traseira, é conhecido por "pitch", ou nível). No momento da desaceleração, a traseira do carro fica mais solta e por isso instável. A ligeira subida da parte traseira, enquanto a frente aponta ao chão, dificulta também o efeito aerodinâmico que deveria ser produzido na asa da retaguarda.

Situação 2: quando em curva, a força exerce-se nos pneus do lado de fora da viragem (VAVEL).

Situação 2: Após a fase de desaceleração, o piloto curva então à esquerda, o que faz com que o monolugar role para a direita, exercendo por isso maior peso, e correspondetemente pressão sobre os pneus direitos, do lado exterior da curva. É frequente a velocidade e força exercidas serem demasiadas sobre os pneus do lado exterior, em curvas mais pronunciadas, daí que ocasionalmente vejamos os pilotos serem obrigados a virar para o lado de fora da curva para corrigir o balanço do carro.

Situação 3: quando o monolugar acelera, o peso é transferido para trás, elevando o nariz (VAVEL).

Situação 3: Uma vez feita a curva, o piloto torna a acelerar, sendo toda a força exercida no eixo traseiro e assim forçando o carro a "agachar-se", levantando o nariz e tornando, em consequência, mais leve -- ou solta -- a direcção.

FRIC vs sistema convencional

As vantagens de uma suspensão FRIC sobre um sistema convencional tornam-se tanto ou mais claras se atentarmos que todas estas alterações no balanço dos monolugares se sucedem em segundos ou mesmo fracções destes.Uma suspensão interligada permite contrariar todas as tendências do carro, independentemente da direcção das forças exercidas, fazendo com que todas as partes respondam em conjunto, como um todo, a qualquer dos três cenários anteriormente referidos.
A imagem abaixo é um bom exemplo de um sistema convencional em funcionamento. A Ferrari, que usa apenas ligação dentro do mesmo eixo, pode aqui ser vista em rolamento lateral. Note-se que Alonso está a curvar para a esquerda, pelo que a força é exercida sobre os pneus direitos do monolugar (vistos no lado esquerdo da imagem). É visível a aproximação do lado direito da asa dianteira ao chão, enquanto os pneus do lado esquerdo do carro perdem algum contacto com o asfalto, podendo causar uma situação de sobreviragem.

F14 T em rolamento lateral (Foto: Ferrari/Ercole Colombo).

Como também já dissemos, este sistema assenta em mecanismos hidráulicos. Na imagem à direita, podemos ver como este sistema interliga pneu direito e esquerdo a um bloco central por meio de tubos hidráulicos ligados às câmaras ora de alta ora de baixa pressão dos amortecedores, que por sua vez fazem a ligação ao bloco central, responsável pela ligação entre eixos e respectiva deslocação de fluidos entre lados esquerdo e direito da suspensão, permitindo nivelar os carros.

Pormenor do sistema FRIC num monolugar F1, com os canais hidráulicos a preto, na parte inferior da imagem (Foto: Sutton Images).

Além disto, a solução inovadora da Mercedes, liga, igualmente por sistema hidráulico, a frente e a traseira dos monolugares, usando o mesmo princípio que vimos aplicado a esquerda e direita, permitindo assim não apenas controlar o rolamento lateral mas também o ângulo do nariz.

Incerteza sobre decisão da FIA

A FIA mostrou abertura para adiar a proibição de uso do FRIC até ao início da próxima época, caso haja acordo entre todas as equipas, o que deverá provar-se difícil, já que as equipas mais lentas ou cujo sistema não seja tão extensivo poderão queixar-se de infracção por parte das scuderias mais bem sucedidas na implementação do FRIC. A decisão repentina da FIA poderá colocar em apuros algumas das equipas, já que estas dificilmente terão um plano B para correr sem o sistema, e certamente terão dificuldade em pô-lo à prova entre o final da sessão de testes em solo britânico -- a Lotus foi uma das equipas que correu sem o sistema na segunda sessão de ontem -- e o próximo GP, em Hockenheim.

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Minhas considerações sobre esse artigo – Ricardo Achcar
Luiz Pereira Bueno, Ricardo Achcar e Antonio Ferreirinha.

Impressiona-me ler sobre esse desenvolvimento com tantos detalhes supostamente técnicos de soluções encontradas por engenheiro não pilotos na F 1 e descritas com maestria jornalística capaz de colocar 99,9% dos leitores em posição de profunda elucubração em busca de interpretar mentalmente o que essa balela da engenharia rica nos traz a tona como elemento evolutivo do sistema de suspensão de um monoposto. Conversa fiada. Sinto muito.
Seguindo o roteiro do jovem Hugo Picado de Almeida autor esforçado da explicação das benesses do sistema...senão vejamos:

1 - EM MOMENTO DE TRAVAGEM: tudo certinho na explicação até o ponto em que lemos: “...A ligeira subida da parte traseira, enquanto a frente aponta ao chão, dificulta também o efeito aerodinâmico que deveria ser produzido na asa da retaguarda...”
Balela. No Pitch de um carro com entre-eixos muito acima de 2500 mm o vetor de “mergulho do carro” no eixo longitudinal do referido Pitch não altera sequer um grau de variação para qualquer lado que seja, para frente ou para trás o ângulo de ataque da asa traseira. Além desse fato sem discussão o grande problema nesse período – início até o final da frenagem e, portanto máxima transferência de massa para o eixo dianteiro encontra-se na relação de perda de velocidade e consequentemente progressiva e iminente perda de pressão aerodinâmica sobre o eixo dianteiro. Sem discussão. Nesse estágio, em alguns metros asas e barbatanas viram latas de enfeite.
Essa relação é absolutamente crítica e não há telemetria no mundo que consiga aferir a RESULTANTE - sendo o efeito dito RESULTANTE a perda progressiva metro à metro da eficiência da frenagem por ausência progressiva de pressão aerodinâmica na asa dianteira e demais... – quando o infeliz dito piloto, entre outras sem o famigerado e impossível elemento denominado ABS se encontrarem disponível para atrapalhar mais ainda a avaliação de pressão a exercer no pedal de freio. Nessa descrição a trezentos quilômetros por hora para setenta quilômetros os engenheiros de box ou de prancheta não tem qualquer espaço ou lugar de presença ou opinião balizada a dar.
Apenas o piloto naquela máxima “de que se vire!”.


2 - Situação 2: Após a fase de desaceleração, o piloto curva então à esquerda, o que faz com que o monolugar role para a direita, exercendo por isso maior peso, e correspondentemente pressão sobre os pneus direitos, do lado exterior da curva. É frequente a velocidade e força exercidas serem demasiadas sobre os pneus do lado exterior, em curvas mais pronunciadas, daí que ocasionalmente
vejamos os pilotos serem obrigados a virar para o lado de fora da curva para corrigir o balanço do carro.

Virar para o lado de fora significa esterçar, quando de fato na linguagem da pilotagem significa compensar. Compensar o que? Compensar o efeito de sincronismo das massas. Se não o fizer vai dar com a cara no “guard rail “..se houver e não for muro. Em pilotagem brasileira denominamos esse efeito por “chicote”.
Mas nada, absolutamente nada termina ai!
O chicote promove um efeito denominado por sincronismo das massas onde o RETORNO a prumo ultrapassa o ponto ideal –centro do carro - para o lado oposto sobrecarregando a mola traseira OPOSTA com a carga do peso natural do carro somado a pressão da carga do chicote. É justamente este retorno de pressão aumentado que faz com que o piloto perca o controle do carro. Esse fator multiplicado instantaneamente por um fator talvez quatro vezes maior foi o que fez com que o Kimi Raikonnen perdesse completo controle de sua Ferrari no CHICOTE de Silverstone. Ali, o BUMP divisor ELEVADO de retorno para a pista COMPRIMIU a mola traseira “N” vezes mais e o chicote de esterço ficou incontrolável. Dá para entender? Mandou enorme pressão de volta – estilingada da mola- incontrolável por esterço de volante.
A importância dessa explicação especialmente para quem tem o vídeo de Silverstone é observar uma cena onde o Felipe Massa ao sair de uma curva media alta com sua Williams LEVANTA A RODA INTERNA (à curva) DIANTEIRA DO SOLO por aproximadamente uma polegada.
Nesse momento ele apoia em TRAÇÃO/aceleração toda a massa no eixo “tracional” vide traseiro do carro e ao produzir enorme esforço “torcional“ sobre o eixo LONGITUDINAL do carro GERA em consequência uma brutal carga reforçada sobre a parte do eixo dianteiro externo assegurando o máximo absoluto coeficiente de aderência capaz de ser sustentado pelo pneu dianteiro externo e o carro...curva perfeito com máxima aceleração de “partida”para a reta que vier.
“Numa das memoráveis considerações do piloto e construtor Inglês Allan Saniforth, encontra-se uma frase definitiva:
“O coração do problema e seguramente o mais significante elemento não aerodinâmico em acerto de chassis, é a relação entre a capacidade de o pneu prover aderência e a carga vertical imposta sobre o mesmo.”

Em se tratando do eixo dianteiro eu me permito afirmar que essa combinação está intrinsecamente amarrada na interpretação correta da combinação ângulo do pino mestre, caster e Ângulo Ackermann do sistema direção para um personagem específico chamado o Pneu daquele Dia.


3 - Situação 3: Uma vez feita a curva, o piloto torna a acelerar, sendo toda a força exercida no eixo traseiro e assim forçando o carro a "agachar-se", levantando o nariz e tornando, em consequência, mais leve -- ou solta -- a direcção.
Isto se torna uma verdade absoluta - agachar-se sobre o eixo traseiro - , no entanto é necessário considerar sem perda de detalhe que o agachar sobre o eixo traseiro que supostamente implica em levantar do solo o eixo dianteiro, nesse caso descrito, desconsidera a brutal força do LSD – Limited Slip Differential mais conhecido como auto blocante capaz de ser programado num F-1 e outrosmonopostos a 30% ou menos de tração positiva o que equivale a 70% de tração sob responsabilidade da roda traseira externa a curva.
Nesse caso o primeiro efeito é “empurrar o eixo dianteiro” para linha reta em frente ou a famosa saída de frente.
No entanto se o efeito “torcional” exercido sobre o eixo longitudinal do chassi somado a força centrífuga que chega até a levantar a roda dianteira interna, a roda dianteira externa estará sendo submetida a um esforço de colagem ao solo limitado apenas pela “capacidade de o pneu prover aderência e a carga vertical imposta sobre o mesmo.”
Viva Allan Staniforth.

Portanto do ponto de vista da física das coisas, em se aplicando a geometria de suspensão adequada ao veículo, é o pneu o responsável final da saída de frente NO LIMITE da física ...e do construtor das “gomas”e nenhum outro fator criativo.


FRIC vs sistema convencional

As vantagens de uma suspensão FRIC sobre um sistema convencional tornam-se tanto ou mais claras se atentarmos que todas estas alterações no balanço dos monolugares se sucedem em segundos ou mesmo fracções destes.Uma suspensão interligada permite contrariar todas as tendências do carro, independentemente da direcção das forças exercidas, fazendo com que todas as partes respondam em conjunto, como um todo, a qualquer dos três cenários anteriormente referidos.
A imagem abaixo é um bom exemplo de um sistema convencional em funcionamento. A Ferrari, que usa apenas ligação dentro do mesmo eixo, pode aqui ser vista em rolamento lateral. Note-se que Alonso está a curvar para a esquerda, pelo que a força é exercida sobre os pneus direitos do monolugar (vistos no lado esquerdo da imagem). É visível a aproximação do lado direito da asa dianteira ao chão, enquanto os pneus do lado esquerdo do carro perdem algum contacto com o asfalto, podendo causar uma situação de sobreviragem.
Este segundo parágrafo é uma bobagem de dimensões razoáveis de quem certamente nunca foi piloto, especialmente de monoposto. Apenas gosta da coisa.
Que se fique logo sabendo que o pneu interno à curva em qualquer máxima condição contribui com apenas 20% do limite de aderência especialmente e unicamente se estiver bem assentado ao solo. Por outro lado, quando mais o pneu estiver ao solo, de 20% a 1% estará retirando igualmente carga proporcional de aderência sobre o pneu dianteiro externo que no bom linguajar segura todas!
Daí voltamos para: “capacidade de o pneu prover aderência e a carga vertical imposta sobre o mesmo.”
Viva Allan Staniforth.

O primeiro parágrafo teria completa e total validade se o assunto fosse lancha....
No nosso caso, baratinha de corrida, quanto mais peso for retirado sobre a carga vertical do responsável geral, o pneu dianteiro externo...bom, chega já foi demais!

Conclusão: o FRIC é burro. Não seria se fosse invenção do Chapman ou do Jack, o Brabham ou do inigualável Jim Hall.
Mas não, é fruto das caras que se encontram atrás da telemetria interpretando com ferramentas limitadas onde o piloto ficou mudo e calado. A F-1 e congêneres de imitação virou um joguinho de sabichões diplomados que interpretam cálculos no limiar do absoluto onde o homem piloto apenas levanta a cortina.

Por fim a Mercedes está dando um banho porque como já foi tecnicamente e indiscutivelmente explicado, genialmente separou a turbina da cânula alimentadora, distribuiu espetacularmente a massa (peso elevado suspenso) e não satisfeita resolveu o maior problema das turbinas. Adivinhem...cabeça fria...temperatura...só nisso ganharam no mínimo 6% de potência geral em todos os planos de curva de torque.
Mas o Williams nesse momento é melhor chassi. Sinto muito. Comparem gráficos de trechos de pista. A RBR ainda não absorveu bem o torque explosivo da dupla traquitana elétrica e o Vettel tem que mandar tração um pouco...depois do que fora antes ...acostumado.


PS: - Em 1965 eu coloquei pinças de freios extras nas rodas traseiras de um carro de turismo. Estas eram fixas ao chassi e acionadas ao frear sobre um meio disco de freio cortado soldado e preso a suspensão lado interno – um de cada lado no eixo traseiro. O objetivo era bloquear o mergulho do carro sobre o eixo dianteiro travando o movimento de transferência de massa da traseira. Tudo igual a essa porcaria de hoje mais burra por complexa. O veículo era de motor traseiro. Vocês não imaginam como funcionava. O horizonte não mexia quase nada. Acho que cedia na “deflecção” mínima dos pneus. Um sucesso no seco a 150 quilômetros por hora. No entanto a 80 km/h na chuva...quando o Allan Staniforth não havia ainda enunciado...parecia que tinha um par de skis nas rodas.
“...a capacidade de o pneu prover aderência (É) a carga vertical imposta sobre o mesmo.”
Daí, se mela, faz farelo ou vira meleca deixemos a engenharia de fábrica brigar com engenharia de pneus. Mas, perdoem os pilotos.
Viva Allan Staniforth.


Cordialmente, aos 76 anos de saco cheio de tanta bazofia automobilística.


FIA, considerações: - Então, por que a FIA quer proibir suspensões Fric agora? Porque Charlie Whiting, que dirige o departamento da FIA, que é responsável pelo policiamento dos aspectos técnicos dos carros de Fórmula 1, assim como o funcionamento dos próprios fins de semana de corrida, acredita que eles têm evoluído ao ponto em que eles violam o limitador de todo regulamento técnico sobre "dispositivos aerodinâmicos móveis". "Tendo visto agora e estudado quase todos os design atuais de frente e sistema de suspensão traseira interligados, a FIA, é formalmente da opinião de que a legalidade de todos esses sistemas poderia ser posta em causa", ele escreveu para as equipes nesta semana. Whiting sugere que a forma como o campo ajudam a controlar os sistemas de suspensão e rolagem poderia estar em violação do artigo 3.15 dos regulamentos técnicos da F1.



Nota do autor: Portanto apenas por se qualificarem como "dispositivos aerodinâmicos móveis.
Não porque ofereçam determinante vantagem...
Ler entre linhas é importante.

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Recebi ontem ou anteontem um e-mail do Ricardo com o artigo de Hugo Picado de Almeida e à seguir suas considerações sobre o sistema, os atuais carros e crise que ameaça a F.Um.
Confesso que caso tivesse visto antes este artigo minha leitura dele não passaria do primeiro paragrafo pois hoje com o advento da internet e a proliferação de "entendidos" em automobilismo a quantidade de baboseiras publicadas não me atrai nem um pouco.
Talvez um pouco complexo e técnico demais para quem nunca lidou diretamente com o automobilismo de competição o texto do Ricardo no entanto elucida muitas das questões que hoje envolvem a F.Um.
Espero que vocês gostem.

Um abraço Ricardo.

Rui Amaral Jr



domingo, 26 de janeiro de 2014

F.Um 2014 por Ricardo Achcar




 
O motor de competição da F1 2014 é uma motor de potência híbrido que desempenha gestão inteligente da energia , e não apenas de potência.

Por exemplo, o motor da Renault Energy F 1 híbrido que foi projetado e desenvolvido para o regulamento 2014 da FIA Formula One World Championship está pronto para a pista para a temporada que começa na Austrália em 16 de março. Novos regulamentos da FIA estão impulsionando os níveis de eficiência energética mais elevada este ano, com dois tipos de energia que impulsionam os carros. Um sendo o motor de combustão interna que irá produzir energia através do consumo de combustível tradicional à base de carbono , enquanto que a energia elétrica será colhida a partir de tanto escape e frenagem por duas unidades discretas geradoras de motores propulsores. Equipes e pilotos vão equilibrar o uso dos dois tipos de energia ao longo da corrida .


Este ano, a unidade de energia é dividida em seis elementos distintos : Motor (ICE) ; gerador Motor Unidade Cinética ( MGU -K ); Motor gerador de Unidade de Calor ( MGU -H); Reserva de Energia/Energy Stores (ES) ; Turbocharger ( TC ) e eletrônica de controle-"centralina" (CE). A combinação do motor turbo V6 de injeção direta de 1,6 litros ( giro máximo de 15.000 rpm) com as duas unidades geradoras de motor e armazenamento de energia da bateria fornecendo potência máxima combinada de 760 cv ( 567 kW), portanto em pé de igualdade com a geração anterior V8 .

Há uma restrição por regulamento duplo no consumo de combustível : quantidade de combustível para a corrida limitada a 100 kg ( -35% a partir de 2013 ) com uma taxa de fluxo de combustível limitado a 100 kg / hr max ( ilimitada nos termos da regulamentação V8 ) . Carros , portanto, precisam usar tanto combustível como energia elétrica combinada ao longo de uma volta .

Unidade de potência . O motor Renault F1 Energia V6 tem um deslocamento de 1,6 litros e vai fazer em torno de 600 cv ( 447 kW), ou mais de 3 vezes a potência de um Clio RS . Devido ao turbocompressor , as pressões no interior da câmara de combustão são quase o dobro do que o anterior V8 . O eixo de manivela e pistões estarão submetidos a tensões enormes e a pressão no interior da câmara de combustão está prevista atingir até 200 bar . A Renault observa que a pressão gerada pelo turbo pode produzir uma "batida de pino" de dentro da câmara de combustão de imprevisível controle. Vale a pena lembrar e muitos vão se assustar, pelo fato que, a famigerada batida de pino nada mais é do que o pino do pistão batendo no interior dos canais circulares que suportam os pinos no interior dos pistões onde se encontram ultra ajustados interligando os pistões com a biela....Um pouco o nosso "Flex"que se ajusta eletronicamente de acordo com o combustível retardando ou antecipando o fluxo de centelha da velas detonadoras ao combustível. Agora, a 200 bar de pressão ninguém ainda viu por onde sai o furo da bala.

De acordo com a Renault , a opção de implementar a desativação de cilindros para melhorar a eficiência e dirigibilidade nas curvas ainda permanece no campo elucubração cerebral justamente em função do problema relativo aos imprevisíveis 200 bar e como eles intercedem ao se somarem a potência de saída de curva aos motores elétricos ao se demandar potência.

Uma parte da energia dos gases de escape recuperado pelo turbocompressor será repassado para o MGU-H e convertida em energia elétrica que será armazenado e, posteriormente, podem ser redistribuídos para evitar que o turbo desacelere em excesso sua rotação mínima indispensável durante as frenagens, o famoso "timelag". Nesse fato vale apena lembrar o Emerson Fittipaldi e Colin Chapman com seu Lotus TURBINA. Emerson dizia que tinha que prever acelerar dois segundos antes...de terminar a curva. Mas apenas um paralelo no que parece ser em 2014 muito mais violento uma vez que o motor elétrico despeja torque constante máximo desde o inicial em que é solicitado, enquanto que o motor convencional tem uma curva ascensional de potência muito mais progressiva.

Em motores turbo convencionais , uma válvula de descarga, é utilizado em associação com um turbocompressor para controlar as velocidades de rotação elevadas do sistema. É um dispositivo de controle que permite que o gás em excesso by-passe a turbina e equalize a energia produzida pela turbina com aquela necessária para o compressor fornecer o ar requerido pelo motor. No motor Renault Energy F1, a velocidade de rotação turbo é controlada principalmente pela MGU -H , no entanto uma válvula de descarga - wastegate - , é necessária para manter o controle total em qualquer circunstância ( transitória rápida ou MGU -H desativação ) .

Ligado ao turbocompressor , o MGS - H atua como um gerador , absorção de energia a partir do eixo da turbina para converter a energia térmica a partir dos gases de escape . A energia eléctrica pode ser dirigida ou para a MGS - K ou para a bateria durante o armazenamento para uso posterior . O MGS - H também é utilizado para controlar a velocidade do turbocompressor para corresponder ao requisito de ar do motor (por exemplo, a retardá-lo no lugar de uma válvula de descarga, ou a acelerar para compensar o turbo lag.) Elevadas velocidades de rotação são um desafio como o MGS - H que é acoplado a um turbocompressor girando a velocidades de até 100.000 rpm .

O MGS - K está ligado ao eixo de manivela do motor de combustão interna. Sob frenagem, o MGU -K atua como um gerador, recuperando parte da energia cinética dissipada durante a frenagem . Ele converte essa em eletricidade que pode ser solicitada nos percursos em todas as voltas (limitado a 120 kW ou 160 cv pelas regras ). Em aceleração , o MGU -K é alimentado a partir da reserva de energia e / ou a partir do MGU -H e atua como um motor para impulsionar o carro .

O calor e a energia cinética recuperada pode ser consumida imediatamente, se necessário, ou usada para carregar e armazenar energia ou a bateria . A energia armazenada pode ser usada para impelir o carro com o MGS - K ou para acelerar o turbocompressor com o MGS - H. Em comparação com 2013 o KERS , o ERS da unidade de potência 2014 terá o dobro da potência ( 120 kW vs 60 kW ) e a energia que contribui para o desempenho é dez vezes maior .


A bateria tem um peso mínimo de 20 kg para alimentar um motor que produz 120kW .

A presença de um trocador de calor ( usado para arrefecer o ar de admissão do motor depois de ter sido comprimida pelo turbocompressor, e portanto, ausentes nos motores V8 normalmente aspirado ), juntamente com o aumento da potência dos sistemas de recuperação de energia faz com que se torne um processo de integração complicado uma vez que a área total da superfície do sistema de arrefecimento e radiadores aumentou significativamente sobre 2013.

Em aceleração (por exemplo, na reta), o motor de combustão interna estará usando a sua reserva de combustível. O turbocompressor será girando à velocidade máxima (100.000 rpm). O MGS - H, agindo como um gerador, irá recuperar a energia dos gases de escape e passar para o MGS - K ( ou da bateria, no caso de que necessita de recarga ) . O MGU -K , que é ligado ao virabrequim do ICE, atuará como um motor a fornecer energia adicional ou economizar combustível , dependendo da estratégia escolhida .

No final da reta o piloto desacelera para frear ao atacar a curva. Neste ponto, o MGS - K  se converte  num gerador e recupera a energia dissipada na frenagem, a qual se armazena na bateria.

Sob frenagem a velocidade de rotação do turbo cai devido à falta de energia nos gases de escape que, em motores tradicionais, promove o "turbo lag". Este fenômeno ocorre quando o piloto acelera novamente: a injeção de combustível começa de novo e gera gases de escape quentes que aceleram o turbo, mas ele precisa de tempo para voltar à velocidade de rotação de potência, onde o motor produz 100% de sua energia. Para evitar este atraso, o MGU-H atua como um motor por um curto período para acelerar instantaneamente o turbo ao nível de sua velocidade ideal .



Ao longo da volta , este equilíbrio entre a captação de energia, a implantação de energia e a queima de combustível (carbono) deverá ser cuidadosamente monitoradas.

A utilização dos dois tipos de energia requer uma gestão especial. A gestão de energia elétrica será tão importante quanto a gestão do combustível. O sistema de gerenciamento de energia ostensivamente decide quando e quanto de combustível para sacar do tanque e quando e quanto de energia para consumir ou recarregar de volta para a bateria.

O objetivo geral agora  é o de minimizar o tempo de dar a volta a volta do circuito em relação a um determinado consumo de energia. Obviamente, se você usar menos energia, você vai ter um tempo de volta mais lento. Isso é bom mas não é corrida. Entretanto, o que não é bom é ser penalizado mais do que a física determina ser necessário. Na relação entre o combustível utilizado em relação ao tempo de volta, há uma linha divisória entre o que é fisicamente possível e a "fronteira - tempo de volta mínimo ' impossível, a essa altura de ser estimado. Uma grande incógnita.


A estratégia é se assujeitar nos seus próprios limites , ou seja, a capacidade dos componentes de PU e regulamentos técnicos . A potência do motor está sujeita a limites regulamentares, além de poder MGU -K e a energia que a bateria pode lhe fornecer, estão todos restritos pelas regras. É um problema complexo. A solução é portanto, determinada pela modelagem matemática e otimização e vamos chamar isso de "administração de potência".

Como resultado, haverá uma troca complexa de energia acontecendo entre os componentes do  sistema, em diferentes níveis de energia ao longo de uma volta. Isto é completamente invisível para o piloto, pois é tudo controlado eletronicamente pelos sistemas. O piloto será capaz de senti-lo, mas sem intervenção do mesmo e poderá se concentrar no desempenho da pilotagem. Claro, haverá certos modos acionados pelo condutor para permitir-lhe substituir o sistema de limitação, por exemplo, para plenos poderes para ultrapassar. Utilizando este modo dependerá, naturalmente, a estratégia de corrida. Em teoria, você pode implementar quantas vezes quiser, mas se você usar mais combustível ou mais energia elétrica, em seguida, você tem que recuperar depois. O "impulso máximo" pode ser sustentada por uma ou duas voltas, mas que não pode ser mantido.


No entanto o que é absolutamente certo para quem já pilotou monopostos é o fato de que transição entre frenagem e aceleração ao longo da competição em se considerando as variáveis propulsoras, certo desiquilíbrio de "convocação"entre o motor a explosão e o elétrico que é máximo absoluto ao entrar me ação não importando o quanto é solicitado (motor elétrico tem torque máximo e constante) vão exigir para início de conversa um revisão visceral (das vísceras) da alma do monoposto que se chama no linguajar do esporte motor: pneus.


Com o torque não previsto, mas imaginado a esta altura e data, da soma de todos os "poderes"de propulsão lá no toque do pedal da direita, no mínimo mais duas lonas internas de kelvlar,  aço inox ou barbante vão ter que ser colocadas na estrutura de construção dos pneus. Algo não importa o nome ou material vai ter que ser inserido nos pneus da F 1. E como todos nós sabemos, a única engenharia que não tem o engenheiro máximo é a dos pneus e quem duvida disso precisa ler mais sobre essa matéria ..se encontrar leitura. É uma babel literal. Uma furiosa improvisação com muito "know-how" com a diferença que este "know-how" dificilmente se escreve ou melhor...repete. Não se iludam que não é calibrar a "escalonagem" de uma caixa de câmbio e ano que vêm no máximo altera-se um dente para cima ou para baixo. Nessa matéria, se cuspir bem no chão muda o desempenho do pneu. Pode até rodar mais rápido mas vai acabar mais cedo. E vai por aí. Pode até classificar no último minuto do treino porque a pressão atmosférica ficou mais favorável para encher os  cilindros de O2. Mas com os pneus, tem disso não. Na Fórmula 1 tradicionalmente se usa de 14 a 18 libras de pressão nos pneus. Os mais peitudos e sensíveis usam pressão baixa, entre outras a única maneira de conseguir controlar melhor as saídas de frente nas entradas de curvas baixa a intermediárias (por ausência de pressão/down force no bico da peste).  Essa Formula 1 já chegou no ponto de ajustar desempenho do carro baixando uma libra de pressão nos pneus...dianteiros. Uma pneu de construção mais dura, vejam bem, isso nada tem a ver com coeficiente de aderência relativa ao "compound"dos pneus. Um pneu de construção  mais robusta para aguentar esse torque eletro-explosão que vem aí é também um pneu muito menos ao solo. Isso você não enxerga na visual. Mas os imperceptíveis quiques do pneu ao solo com suas ondulações mínimas reduzem intermitentemente o peso/massa gravidade que mantem  o carro no chão...colado, e portanto você pode ter uma perda de aderência somada de té 70% do coeficiente de gripp/garra ao solo. Pressão de pneu! É assim que esses pilotos estão ajustando os carros agora. Vai "dechapar" pneu em saída de curva ou vão andar no mínimo com uma variante de seis segundos pior em pista de referência. Vamos ficar com Spa.


Ricardo Achcar

terça-feira, 2 de julho de 2013

Volkswagen & Sauer na Super Vê - por Ricardo Achcar

Aos 70 anos de Chico Lameirão. Campeão um forte abraço de todos! 


Ao homenagear a memoria de Sauer, o piloto, construtor e antes de tudo homem de ação Ricardo Achcar mostra que olhando o passado, com os pés fincados no presente, podemos juntos trazer de volta o grande automobilismo praticado no Brasil!

Obrigado meu amigo e um forte abraço.

Rui 

terça-feira, 21 de maio de 2013

A melhor corrida? Ricardo Achcar



A melhor corrida?
O tempo marcha nos alcançando e na medida em que vamos virando história muitas pessoas perguntam aos pilotos qual foi sua melhor corrida. Nesta altura penso no Rubens Barrichello com seu extraordinário recorde de presenças em GP e enorme experiência pouco aproveitada nos tempos em que vivemos uma categoria principal de vendas de assentos. Imagino que enorme contribuição ele poderia dar participando dos Grandes Prêmios da atualidade que seriam incorporadas nos carros de competição em benefício do universo automobilístico. Esse nível de experiência não se colocando a serviço é uma perda irreparável para o esporte motor. 
Por isso, fico dando cambalhotas de alegria quando o Kimmi Raikonnen mandou via radio/voz o engenheiro com seus gráficos la no box ficar calado que ele sabia o que estava fazendo naquele grande premio de Abu Dhabi . 
É "um" tal de meter a colher de pau em todo canto nos dias que vivemos de arrepiar os cabelos. Como se estes pudessem prever o imprevisível. Podem anunciar uma possibilidade de problema e ocorrência através dos sensores transmissores instalados o que já é bastante futurístico, pois é a finalidade da observação nas telas nos boxes, mas propor uma variante que depende da pilotagem se torna uma perigosa invasão. Eu acredito que um piloto tenha nestas condições uma posição indiscutível de visão antecipada do que pode ocorrer, interpretando o aviso. O conceito de competição na Fórmula 1 está sem dúvida fora da realidade. Muita interferência vocal e especialmente desconcentração do piloto estão inseridas neste contexto. Eu posso afirmar que em 
condição de ataque ou defesa no transcurso da competição, um piloto articula com grande antecipação onde e como pode eventualmente segurar um adversário ou ultrapassa-lo cujos limites gerais, máquina e piloto se equivalem muito nos que estão no topo da linha. É literalmente um jogo semelhante ao Xadrez. A estratégia se encontra na antecipação.
Em 1970 no torneio que foi complicado para mim, denominado por BUA - British United Airways, durante a prova do Rio de Janeiro, na segunda bateria - eu fora obrigado a sair em último lugar na primeira bateria porque não pudera classificar com um motor onde se encontrou um parafuso cravado no pistão... e não pude classificar - portanto, saindo em 12º lugar alcancei o líder Emerson Fittipaldi na sétima volta e conseguira no vácuo finalmente ultrapassar no final da reta antes da Sul. Emerson tinha na sua equipe Lotus cinco motores Holbay disponíveis e eu tinha um motor Steel na minha Lola T210. Ficou logo evidenciado de que ele tinha aquele cabelo a mais de motor, mas eu tinha o controle absoluto da pista.
Emerson tentou durante duas voltas onde podia passar que era onde eu o havia passado, sem sucesso, no final do retão antes da curva Sul. Eu sabia que em algum 2 momento ele iria me passar e eu teria todo o trabalho de novo para recuperar, sabendo que ele iria se defender melhor desta feita. No entanto eu me preparei por duas voltas numa trajetória regular tangenciada enquanto eu sabia fazer a Norte por cima na rampa e na terceira volta surpreendi o Emerson que achou que eu estava perdendo o controle do carro e sai uns vinte metros na frente dele no retão o que me permitiu com muito mais carro no chão abrir onze segundos dele até...acabar a gasolina. 
Mas isso é outra história...Mas é um exemplo claro do quanto o piloto precisa de concentração e estratégia por conta própria sem interferências...


Ricardo  lidera Emerson, Torneio BUA 1970 etapa Rio de Janeiro.

Outro percalço mortal é o da administração do desgaste dos pneus. 
Este fator então simplesmente destruiu boa parte do conceito absoluto do heptacampeão Schumaker. Assistam a largada no Youtube do grande premio de Monza de 1973, por exemplo, entre outros mil e imaginem alguém pensando em administrar o desgaste dos pneus...Peroba Bueno...- o Luzinho Pereira Bueno - costumava "roncar cavernosamente" com seu vozeirão de baixo tenor, algumas irreproduzíveis palavras que explicavam bem o assunto que se resumia no seguinte: onde começa a pilotagem e onde começa a administração e sobretudo: porque ter que administrar uma corrida de Formula 1?
Vendo Peter Gethin na largada e primeira volta do GP de Monza você vê e duvida daquele carro na parabólica, na ponta e nas quatro em derrapagem controlada e ainda assiste a manada toda na mesma batida. Sim, era mais perigoso, havia menos proteção e matava mais. Era a Fórmula 1.
Mas a pergunta a ser respondida é outra. Estou de fato curvando por fora por causa da chuva. Já vou trilhar de novo...
Muitas horas de recapitulação transcorreram na minha mente agradecida por estas perguntas diretas e impossíveis de serem respondidas sem um embaço no canto do olho. 
Daí... perdi a trilha e ia indo por fora...
Sim. A Melhor Corrida...
Vou me ater a uma dessas Etapas do Tempo porque envolve personagens a quem devo o que não posso mensurar apesar de alguns não terem feito nada diretamente para minha pessoa, mas para o bem do circo, estivesse o circo no nível que fosse, de Formula Ford a Formula 1. Para muito bem do circo que é o esporte motor quando esporte motor.

De alguma maneira o Chris Steel, fabricante certificado pela Ford para fazer os motores  Steel já estava incomodado havia algum tempo. Havia feito mais de uma dúzia de motores para testes de motores e carros inclusive dos pneus F 100 Firestone destinados à Formula Ford em substituição aos Avons Cross Ply. Ainda, lutou muito para conseguir convencer o mago John Webb, da administração das pistas de competição privatizadas da Inglaterra precursor absoluto do gênio que veio a ser o Eckelstone. 
Em todos os testes os tempos baixavam com os ajustes do piloto brasileiro. O cara precisava voltar para as pistas. 1970 "estava" a chegar há alguns meses e a Formula Ford, a mais poderosa do mundo em produção e numero de participações nacional e estrangeira crescia de forma exponencial. 
A America, via Carl Haas, já falava abertamente na importação de 250 monopostos e a briga ia ser fenomenal na área dos certificadores de motor porque o padrão Inglês iria ser seguido à risca em termos de regulamento apesar do motor "Cortina" ser desenho e produção da Ford Inglaterra. Mas esta tinha sido a exigência da FIA, onde pressionava com muito respeito que detinha o próprio John Webb. 
Webb sonhava com a possibilidade da integração americana e estrangeira intercontinental na Fórmula Ford na Inglaterra, porque barata, lógica e por todos reconhecidos como fomentadora do esporte motor, nos faz hoje enxergar, décadas após o fato, o quanto o Bernie seguiu o roteiro num plano mais elevado graças a TV....

A Fórmula Ford era a menina dos olhos do esporte motor vinte anos depois da guerra e representava o nicho mais importante da evolução da indústria do país que se revelava extraordinariamente parecido e em paralelo ao que Reginald Joseph Mitchell havia inoculado no orgulho da Inglaterra com o seu Spitfire Supermarine, aquele avião que havia sido projetado para vencer em corridas aeronáuticas e acabou vencendo a batalha da Inglaterra. 
O país pulava de uma indústria automotiva caquética, conservadora, retrograda porem plena de clichês burgueses com suas deliciosas viaturas monolíticas onde o conceito de penetração 
aerodinâmica terminava na ponta do nostálgico cachimbo do cidadão. Quanto charme este carros 
tinham e como eram ineficientes ao ponto de ser deficientes e parcialmente paraplégicos e sem recursos...Mas o Spitfire...
Quem conhece o histórico caso da Pointe du Hoc da segunda guerra mundial horas antes do desembarque no dia 6 de junho de 1944, penetra devagar mas com segurança na formidável noção de comando histórico que se não se encontra acesa ou inflamada, rescalda infinitamente no bojo estomacal de qualquer Inglês. Aquilo é latente.
Eles jamais largariam o cetro reinante do esporte motor sob todas e totais facetas a cada passo que o automobilismo dava se expandindo mundo afora. Eles haviam enxergado a chama do desafio, A APOSTA, veneno mortal da alma britânica. Quem conviveu com eles em todas as classes e níveis percebe o infinito desejo de desafio do impossível com fleuma, certo desdém, mas infinito orgulho e prestem bem atenção: compartilhado. Lá no Pub, todos os dias nos horários que a rainha permitia. Todos se reconhecem todos se respeitam, todos observam seu nível de ascensão, vitória, desafio e todos buscam um meio legítimo de compartilhar expondo igualmente até onde chegaram entre si para a glória total e completa da nação britânica. Por isso tem monarquia democrática com reclamação, desdém, crítica e um infinito amor. 
Aprendi na Inglaterra que o provável único meio de você desarmar completamente um Inglês é dizer - Help me!
É indefensável. Você irá encontrar a justa ajuda sempre que esta for justa no sentido de te colocar em pé de igualdade como indivíduo. Você também vai encontrar a dura cobrança pela sua invocação. Acredite: caminhar em direção de bem suceder para não chamar de sucesso é a forma mais plena de satisfazer sem mais comentários ou sequer lembrança de um dia ter ajudado um cidadão de respeito britânico. 
E, o Chris Steel, anteriormente engenheiro de torpedos estava profundamente incomodado. Chris entendia muito bem que os treinamentos e ajustes de carros de outros pilotos bem como os testes de equipamentos estava suprindo o piloto brasileiro com bons meios de sobrevivência, mas ele achava que o cara valia mais do que isso para ele mesmo tanto quanto para si, Chris Steele. 
Sua experiência com o Australiano Tim Shenken e um tri campeonato Inglês lhe davam uma envergadura e presença no meio do esporte motor bastante importante. Mas, aquilo era o esporte motor. O rei morreu, viva o rei. Shenken se fora a caminho da F III e em busca de continuidade na carreira. Chris pensava muito em se envolver em F III, F II e talvez mais adiante quem sabe...
O caminho mais curto estava decididamente no campo da Lola com seu envolvimento nos EUA e o presidente da Associação de Pilotos de Gran Prix, Joachim Bonnier que era especialmente simpático com a ideia do Brasil voltar a brilhar no esporte motor como fora nos anos pós-guerra. Já havia demonstrado enorme simpatia pela dupla apresentada por Stirling Moss e especialmente comentara sobre o jeito de ajustar carros que um dos pilotos demonstrava secundando o Chris nos testes de pista.
Queimando suas meninges, Chris finalmente resolveu telefonar para a Merlyn em Colchester e falar com o Selwyn Hayward, fundador e proprietário da pequena empresa joia do esporte motor britânico. Selwyn é um nome que merece respeito e lembrança de ter nos deixado em Março de 2012. Com sua autoridade de campeão tri com os carros Merlyn, explicou com detalhe o acidente e perda total do monoposto em Oulton Park de um dos pilotos da Equipe do Stirling Moss. Isso o estava impedindo de prosseguir no campeonato e o Moss já havia gasto um bom dinheiro com o acidente do outro piloto logo na sua estreia. Havia alem do mais muitas dificuldades de receberem os dinheiros dos patrocinadores no Brasil mensalmente. Estava difícil conseguir repor o piloto nas pistas e queria saber se poderia contar com a ajuda da Merlyn. 
Selwyn aparentemente não entendeu bem e retrucou ao Chris que estava com a produção totalmente vendida e com entregas de quatro meses a completar, portanto o que ele poderia esperar que pudesse fazer. Chris retrucou perguntando se não tinha um carro de teste que pudesse dar conta do recado. Aparentemente, Selwyn não querendo negar nada ao Chris a quem de alguma forma devia muito do sucesso, lhe disse então: "temos aqui um chassi e triângulos montados no monoposto que o Teddy Pillete pilotou em 63 pendurado na parede, é a única coisa que poderíamos pensar em usar". Nisso o Chris agradeceu, disse que iria pensar no assunto e retornaria se fosse o caso. 
Cerca de três dias depois de sair fumaça da cabeça o Chris me chamou para testar o carro do piloto Geddes Yates filho de família abastada que estava vendo as nuvens passar com o carro e precisava de um piloto de teste que o auxiliasse a ajustar a máquina. Agradeci, já eram mais uns trocados que me entrava ao bolso e marcamos para a quarta feira de testes livres em Brands Hatch.
Yates era mais do que simpático e obviamente um decidido piloto amador. Mas como com os Ingleses não se pode achar nada com antecedência e de repente morde-lhe a mosca azul e o cara resolve ser piloto de competição ainda por cima com meios, eu me empenhei a rever a máquina dele e dei um bom trabalho aos mecânicos. O carro estava necessitando realmente de um ajuste competente. Sentamos alternadamente no carro para andar no circuito clube em séries de quatro voltas com cronometro ativo. Consegui colocar o carro a oito décimos do recorde da pista e Yates melhorou cerca e dois segundos na melhor volta o que era um máximo num circuito clube. 




Estava exultante e aproveitou para me apresentar o Vern Schuppan. Vern fez de tudo para me levar para a Austrália onde ao longo dos anos se tornou uma figura importante no esporte motor na Nova Zelândia, Austrália e principalmente no Japão onde fez fortuna ao longo de uma carreira muito interessante. Enquanto Yates ficara feliz com os resultados, o Vern que conhecia a rota pregressa do Yates ficou absolutamente atônito com o resultado. Ele me encostava à parede do box e me perguntava como é que podia fazer aquilo que eu conseguira em quinze a vinte voltas. Então me contou a trajetória de Yates em alguns meses correndo com oficinas especializadas, equipes de teste e bastante dinheiro sem nunca conseguir chegar a resultado sequer satisfatório. O que o Vern não sabia era que o Yates sabia ouvir e interpretava muito bem e me alcançou rapidamente se valendo de algumas informações de cocheira necessárias, mas que são em 95% dos casos inúteis para a maioria dos pilotos que tive contato em pista. Ele entendeu de imediato que a função do estabilizador naquela pista e em duas curvas exercia função negativa se o traçado fosse ortodoxo, tipo instrução de quadro negro. Isso lhe valeu destarte uma resposta no acelerador que inicialmente o assustou conforme comentou comigo. Mas teve coragem de se valer da informação e em meia dúzia de voltas pegou o jeito. Yates teria tido sua oportunidade se fosse levar o caso a sério e eu tive esperança de que talvez viéssemos a fazer uma equipe. Acho que se manteve muito bem no esporte até cerca de dois anos que o conheci. O Chris também navegou nessa ilusão, mas...acredito que a família cortou-lhe as azas. 
Entretanto Chris comentou comigo o caso da "mula"do Selwyn la em Colchester e eu fui em busca das fotos do carro e finalmente pedi para o Chris se ele conseguiria estabilizadores do MK11A e um jogo de amortecedores Spax novos com a Spax fábrica. 
Os estabilizadores tipo invertidos do MK 7F II seriam impróprios para os modernos F 100 radiais, essa era a minha previsão devido a uma experiência muito segura que tive com os Cinturatos VR e HS o que pouca gente sequer tinha ideia do que se tratava nos anos que fui campeão Carioca e Brasileiro como piloto contratado da equipe Fittipaldi em Formula Vê. 
Ter uma noção sensitiva do que pode fazer um estabilizador em monoposto que entra em ciclagem com a mola helicoidal é muito importante especialmente usando pneus de pressão media alta o que é o oposto da presente realidade. Experiência nesse campo transcende o tempo e tem um valor inestimável e que demonstra a importância do exercício do piloto aspirante na pilotagem em pneus radiais de alta deformação, baixo coeficiente de aderência, resvalo ao solo (fator visceralmente importante porque é a origem radical do "stitching" mortal nos pneus de competição da atualidade). O maldito pneu "slick" mascara por completo todos estes efeitos a ponto da engenharia da atualidade que sabe pouquíssimo sobre pneus - todo engenheiro conhece apenas um 
"pedaço"- se vale descaradamente a "acertar" o carro - estamos falando de monopostos na Fórmula 1 - baixando ou elevando, leiam bem ; meia libra de pressão a mais ou menos nos pneus porque o piloto não tem a sensibilidade da suspensão sob o efeito Down Force que se altera de acordo com a velocidade de tráfego, para se balizar. Daí a importância da experiência indispensável do uso do pneu radial de rua em competição de monopostos escola. Atualmente na F-1 o piloto é balizado via rádio do box para ajustar pela tela do engenheiro.
Por isso a Formula Ford Kent em 2013 conseguiu se manter viva na Inglaterra quase cinquenta anos depois de nascer. O piloto necessita de um ano sério de kart/slick para dominar telemetria e labirinto. Um kart pode simular a velocidade de 300 quilômetros por hora porque rola ao rés do chão. No mínimo um ano de Fórmula Ford Kent radial ou nunca mais teremos um piloto brasileiro na F 1. É no que acredito.

Quando Chris retornou uma ligação telefônica para o Selwyn, confirmando o interesse em rever o caso do chassi pendurado, disse-me ele posteriormente que o Selwyn ficou meio que mudo. Finalmente retrucou: Chris, eu não tive tempo de te dar detalhes. O chassi tem um empeno diagonal. Eu não tenho a menor condição de coloca-lo no gabarito porque a estrutura é similar, mas não é igual ao chassi da serie atual. 
Chris perguntou de quanto era o empeno e o Selwyn disse que não sabia, mas era de pancada de subida em calçada em Mônaco...
Ele estimava em torno de uma polegada diagonal. Chris pediu um tempo e que ligaria de volta. 
Pegou o telefone e me chamou no hotel no dia seguinte cedo. Foi narrando o assunto com detalhes mais me consultando do que outra coisa, sem muito entusiasmo. Definitivamente me expondo uma situação onde ele demonstrava o seu empenho me beneficiar com o que fosse possível para que voltasse para as pistas. Quando eu lhe disse que fossemos pegar essa "Mula" que eu achava que dava para dar um jeito, ele é que ficou mudo. Passado um tempo de silêncio, Chris me disse algo que me tem em inestimável valor: "If you say so I am not here to say no. Lets go". Se você 
assim diz eu não tenho como dizer não. Vamos lá. Falou o Britânico.


Antonio olha bravo!

Vinha essa confiança de "masmorrentas" brigas ocorridas nas pistas onde resta uma testemunha chamada Antônio Ferreirinha. Chris nunca soube as vezes que correu o risco de levar uma tamancada do Português no meio da cara. Mas tivemos alguns pegas sobre o assunto acerto de carro e performance de motor dignas de um livro. Num destes memoráveis, o Chris me botou no carro pelas mãos do Antônio e do Peter Hull - saudades desse Neo Zelândes piloto, jornalista e mecânico - o que ele denominou como sendo o melhor motor que saiu do dinamômetro e pediu para irmos para a pista testar.
Ao cabo de uma dúzia de voltas, já não me ocorre com precisão eu notei um queda de duzentos giros no final da reta de Brands Hatch Club Circuit que era um ponto de referencia de piloto, portanto coisa de piloto. Como o conta giros era do tipo espia da Smith, ao parar no box e o Chris me perguntar se estava com problemas no carro - ele já queria o recorde da pista, nada mais do que isso - eu lhe retruquei que não. Informei que o motor havia perdido duzentos giros na final. Chris ficou pálido e roxo ao mesmo tempo e de repente explodiu de voz mansa com os olhos injetados e para os ouvidos de todos à volta me disse em pleno inglês: "como você seu macaco marron do brasil tem coragem de me dizer que este motor perdeu duzentos giros?" No que eu lhe disse britanicamente: "Perdeu duzentos giros e é uma válvula de descarga do terceiro cilindro que está vazando".


Antonio e o cabeçote...

Nova explosão espumante do Chris: "como você pode afirmar isso olhando para essa porra de carro"? Posso Chris porque na minha terra de macacos eu não tenho dinamômetro. Eu só posso enfiar o dedo na descarga, enxergar a cor que me vem ao dedo, colocar a mão sobre cada cabo de vela junto à porcelana da vela e sentir a temperatura, a que estiver mais fria é a sua alma. Chris ficou mudo um tempo depois disse vamos levar agora este carro para a oficina dos motores e o Antônio vai se ferrar para tirar o motor sozinho. Assim a foto ao lado mostra o dia em que o Chris viu o querosene vazar do terceiro cilindro do cabeçote de cabeça para baixo que ele colocou na bancada. 
Depois, parou e pediu para o Pete Hull fechar as janelas e portas. Apagou a luz e nos convidou para jantar. Aí ninguém acreditou. Ele teve que insistir. Como o Pete Hull era um gozador nato, Neo Zelandês é uma "figuraço" por natureza, estranhou o Chris Steel que foi logo lhe dando uns coices a moda inglesa no que o Pete "emburacou a viola". Um jantar pago pelo Chris era motivo de uma publicação na revista de esporte motor da Nova Zelândia onde o Pete rabiscava. Bicho, o inglês era pão duro! Daí, um chassi torto apenas uma polegada na diagonal não era motivo de ele Chris a esta altura se preocupar. Tinha que arrumar os amortecedores. Isso sim ia lhe custar às 
lágrimas...
Dois dias depois o Pete Hull me telefonou da oficina Steel de motores e me informou que havia rebocado na carreta da empresa desde Colchester a até a oficina e que o "assunto" estava a minha disposição. Perguntou quando eu poderia dar presença em Swanley. Disse-me ainda que o Chris quisesse que eu fosse inscrito para Mallory Park no Domingo - campeonato Inglês Les Leston - seguinte à semana que estávamos. Tinha que me inscrever como independente. Era uma quinta-feira e Pete ainda me sugeriu que desse um pulo na oficina do Stirling Moss onde o meu monoposto destruído se encontrava e avaliasse as peças que poderiam servir na montagem do conjunto que ele trouxera de Colchester. Eu entendi a mensagem do Pete, mas também fiz cara dura e não perguntei mais nada. Tinha chegado no limite do bolso dele.
Fui com Antonio e fizemos um levantamento do podia servir na remontagem do monoposto que a Merlyn emprestara. Dentre as boas coisas, eles haviam claramente entendido que eu nunca teria um radiador de água/óleo combinado salvo do acidente em Outon Park onde doze carros foram pelos ares e eu capotei acredito umas três vezes ponta cabeça. Tudo por um erro de cronometragem razoavelmente típico nos idos dos tempos. Minha cronometragem do box me colocava com o segundo tempo. Outros competidores haviam sofrido o mesmo engano de maneira que a mixagem da largada estava verdadeiramente perigosa. Mas não havia nada que se pudesse fazer e muito menos atrasar o expediente do programa de competições. Afinal era a prática normal classificar pela manhã em vinte minutos e alinhar para competir na parte da tarde em horário cronômetro. Luiz achava que tinha sido cronometrado com o primeiro tempo no nosso box e acabou ficando por sorte com o segundo tempo. O grupo de carros em que se encontrava na largada passou para o que logo a seguir virou um amontoado de carros logo antes da Old Hall Corner após os boxes. Foi infernal. Acabei perdendo temporariamente a visão do olho esquerdo e abri uma brecha enorme em ambas as mãos diante do reflexo condicionado de levantar os braços para não ser ejetado apesar do cinto de seis pontos. Virado ao solo na final da capotagem, o asfalto lixou minhas mão em regra. A gasolina saia do pescador no pico do Sto. Antônio e se derramava na minha cara, macacão, capacete enquanto eu me refazia do susto de ver as fagulhas 
enormes do Sto. Antônio raspando o chão. Há dois metros do meu cockpit de cabeça para baixo a Lianne Engemann gemia com o braço quebrado presa nos destroços. Nunca vou me esquecer de que quando consegui me desvencilhar do carro corri para a mureta de madeira e barranco e me sentei em cima. Então me dei conta do silêncio que reinava nas pistas onde ao redor milhares de espectadores se encontravam totalmente mudos. 




Ao longo de um tempo breve começamos a ouvir o zunido de abelhas que se transformou gradualmente no ronco dos motores dos que haviam passado pelo acidente e o diretor de prova correndo ao centro do asfalto com a bandeira vermelha, desesperado que alguém passasse do ponto crítico. 
Uma imagem que ficou para sempre. Depois que a adrenalina se diluiu e que vem o impacto que pode gerar uma eclampse, fiquei junto com outros por duas horas até que me liberaram. Chris e minha namorada a Paula na época me levaram no carro dele para o hotel pensão Trevose em Londres. Uma viagem de seis horas na época de Chester para Londres. Fui dormindo no banco de trás e acordei dois dias depois do evento no quarto do hotel recuperado da vista e com as mãos ardendo.
Um fim de semana de setenta horas transcorreu em intenso trabalho com Ferreirinha, Hull e eu montando o que veio a se transformar num monoposto. Ao cabo do trabalho, quando eu pedi para o Pete sentar no carro para calibrar a torção do chassi com combustível e carga de rolagem, o Hull me olhou de cima abaixo e me disse: "você vai mesmo sentar de vez nesse troço e acabar com sua reputação e carreira"? No que eu lhe respondi: - a carreira provavelmente já terminou. O sucesso do Emerson ascendendo a F III com a ajuda do Jim Russell e mais algumas outras vai direcionar os olhos do Brasil e patrocinadores exclusivamente para ele. O Brasil só sabe jogar na exclusividade. Não compartilha e não vai para lado algum. É o complexo de ser "one show man". "Quando terminar esta temporada, venha passar um tempo comigo no Brasil". E o Pete Hull veio e conheceu a terrinha e pôde enxergar como jornalista como funciona isso aqui.
A essa altura eu me distanciava do Luizinho por força igualmente de sua decisão em disputar o campeonato Inglês onde já se colocava com brilho. A cada um sua colher de pau. O campeonato Inglês de Formula Ford Les Leston, não significava nada para mim. Eu sabia no meu íntimo que eu precisava ser adotado por uma fábrica como piloto de teste, porque isso era o que valia na época. Depois tudo viria de forma muito mais efetiva e independente da forma total da dependência de patrocínio absoluto e direto. Também, não podia em momento algum esquecer que eu era Carioca. Onde se vira um Carioca andar de carro? Afinal, automobilismo era em São Paulo onde tudo acontecia na tradicional fantástica pista de Interlagos.
Naquele tempo saber acertar um carro não era o procedimento principal de engenharia. Cabia ao piloto corrigir a engenharia nos detalhes que resultavam em desempenho efetivo. Na atualidade fica a cargo da interpretação telemétrica salvo quando um piloto do calibre do Alonso muda o traçado e destrói a hipotética telemetria. Pneus slick que nada representam para a indústria automotiva e primordialmente azas e barbatanas que produzem efeitos que não fazem curva e todo o mundo se esquece disso, definem aquilo que já de há muito não é um carro de competição de pista. O monoposto da atualidade é um veículo de competição híbrido no que tange o conceito de um carro de competição. Se ficassem apenas os pneus slicks, haveria ampla justificativa porque a 
composição deste produto altamente sofisticado e amplamente desconhecido poderia descontar o efeito "down force"/ dito efeito solo ou aza invertida. Neste caso a engenharia subtrairia um enorme dado inconstante da equação desempenho e segurança, bem como aumentaria de forma exponencial o valor específico do piloto na concepção fundamental da sua capacidade pessoal e habilidade esportiva. O maior exemplo na atualidade do efeito negativo dos dados expostos neste contexto está diretamente relacionado com o desempenho diferente para não se expressar outra coisa do hepta campeão Michael Schumaker. Dizem que ficou velho. Schumaker está na idade exata de ser um candidato a se tornar astronauta. Onde um Barrichello ficou velho? Que conceito de avaliação nos trás este tipo de julgamento? O INEXPLICÁVEL e algumas interpretações globais.... que infelizmente pesam.
De fato um piloto envelhece para esta atividade muito mais cedo do que para outras atividades. Mas este envelhecimento tem que se correlacionar com algo um pouco mais tangível do que a afirmação de ficou "velho". Este esporte está queimando etapas em todos os sentidos e nós estamos dando força para o inexplicável e idiota. O grande Ayrton Senna ficou ultra vulnerável na troca que fez entre a Mc Laren e a Williams no seu tempo final de atuação. Por quê? Porque as alterações feitas pela FIA para o ano em que o Ayrton iria pilotar a Williams tida como o carro vencedor indiscutível, aleijava o monoposto especialmente na questão da retirada da suspensão 
ativa. E não foi somente por este principal aspecto mecânico. Houve outros, mas este foi o principal somado ao que se segue. A responsabilidade pública que Ayrton assumiu muito bem impulsionado pela imprensa nacional exponencialmente convergente no tema do sucesso ou nada. Ninguém é de ferro. Ayrton morreu seis meses antes, esta é minha opinião de uma forma de morte anunciada para quem soubesse ler nas entrelinhas dos eventos que se precipitaram de forma unidirecional e repito: convergente.
Por exemplo, nos treinos em Interlagos da F-1 no fatídico ano e que aconteceu justamente antes de Ímola, fui assistir os treinos com o Chico Lameirão. Caminhamos pela pista portando nossas credenciais e fomos onde cabia mais assistir, ou seja, para a curva da junção. A curva da junção em Interlagos apresenta um conjunto de situações exclusivas particularmente para quem testa para ajustar um monoposto. O motivo técnico dessa realidade de um trecho que graças a Deus ninguém de fato mexeu se define em vários pontos. Salvo um amplo alargamento como área de erro ou escape de pista que de fato abriu as comportas para se engajar em barbeiragens anteriormente imperdoáveis, o trecho é tecnicamente espetacular, senão vejamos: a- o trecho em descida saindo do cotovelo e fazendo tomada cautelosa para se poder abrir o mais cedo possível o acelerador ao máximo para encher o motor ao ponto de permitir uma troca de marcha, implica em conhecer muito bem o ponto de frenagem. b - este ponto de frenagem é profundo e de pico. Nesse ponto você carrega a massa de transferência do carro toda para frente e no instante que relaxa o freio já exerce rápida rotação do volante para a esquerda. c - Neste movimento a cabeça do piloto já conta com um ligeiro sobre esterçar advindo do início de subida que pode gerar um "bottoming" - bater o fundo do chassi ao solo - muito propício nesse trecho, ou seja, fim de curso de suspensão traseira ao se comprimir por retorno anterior da massa da frenagem e compressão do eixo traseiro devido a novo rumo inverso em ascensão produzido pela aceleração. O monoposto ataca a subida de um instante para o outro. Todos os elementos conhecidos nos termos ingleses de movimento do chassi ocorrem naquele trecho curto, Yawing, Diving e Squating , rotação axial no centro do carro, mergulho por compressão devido a subida, compressão devido a mudança de pressão no eixo traseiro. Em monoposto estes 13 movimentos são drásticos. Em F- 1 não se fala. São brutais e a previsibilidade do piloto está no pico máximo do possível. Sem a suspensão ativa Ayrton deu uma rodada naquele ponto, nitidamente sobre o eixo traseiro que deixou o Chico e eu de cabelo em pé. O Chico ainda se virou para mim e disse na minha cara a queima roupa: ele vai se matar. Eu retruquei, porque você acha assim? No qual o Chico me olhou fixamente e percebendo que eu sabia exatamente o que se dera naquele ponto, sem hesitação, sacudiu a cabeça e me mandou a merda. 
A suspensão ativa agora ausente somada a outros fatores secundários não iriam perdoar Ayrton em Ímola ou mais adiante. A pressão do jovem Shumacker em plena ascensão sob o comando do Briattore era outro problema considerável, agora com uma Williams muito inferior ao que fora na temporada passada....
A esperança era que o triangulo de suspensão não tivesse "rotacionado", quebrado e entrado por dentro do capacete do incrível campeão. Só do impacto havia muita esperança. Afinal ele ainda havia trocado três marchas quando ficou sem...a coluna de direção. Mas isso é outra história.
Quando o Chris apareceu na segunda à tarde na fábrica, era um sorriso só. Havia vendido duas dúzias de motores. O Yaetes botara a boca no mundo e o Schuppen assinava em baixo. Os motores eram o diabo e o teste comprovara isso. E o que a gente podia esperar mais? Ele queria o carro do Yaetes voando e voando o carro estava. E o Chris estava feliz.
Sem menos avisar o Chris se virou para dentro do galpão e se deparou com aquilo - the thing - como apelidou. Quando se voltou para nós era outra pessoa. O Antonio logo pressentiu que vinha 
porcaria e saiu do salão para acender um cigarro do lado de fora no pátio. Logo o Inglês perguntou se eu estava doido e como é que eu teria cara de me apresentar com aquele carro. Ele entendia que a carroceria do Merlyn original do MK11A que era integralmente escamoteável pudesse simplesmente vestir o MK 7 F II. Nem tão pouco imaginara que a carroceria do meu carro ficara em frangalhos. Finalmente entendemos porque o desespero do Chris. A pista de Brands Hatch naquela quarta-feira de treinos livres havia sido alugada pela Cosworth em associação com a Ford Inglaterra para uns ensaios de motores da F-1. No final das contas essa alocação foi cancelada e o fato é que não havia dinheiro para se alugar espaço em outra pista mais ou menos próxima assim como o Chris queria ajudar, mas não despender... Finalmente ele acabou se estourando e dizendo que não poderia participar de fiasco, mas que me dava força e que eu podia usar o motor na corrida. Ele não compareceria. Não podia correr este risco pessoal. Desejava-me boa sorte. Proibiu o Pete Hull de ir a Mallory portando o macacão Steel. O Pete era mais duro do que pau Brasil e o Antonio finalmente segurou a barra toda sozinho com alguma ajuda minha.



Naquela manhã de Sábado estávamos meio que esfomeados. O raio do dinheiro do patrocinador Shell-Rhodia-Tergal, a parte que me cabia não havia chegado. Estávamos bem apertados e a ausência do Steel não ajudava em nada. Antônio e eu, éramos dois independentes alinhando uma possibilidade. Um sentimento de solidão reinava com o Antônio resmungando cavernoso que aquilo era o final. Carioca de merda metido a besta vai aprender agora a varrer oficina com o Peter Hull, resmungava. Os pneus estão uma merda fora do regulamento. Não vai passar no "scruteneering" resmungava. Mas vai dar para fazer o treino e ver às quantas andam essa "xabironga", dizia eu para o Português muito mal encarado naquela manhã e com fome. Tínhamos praticamente dormido ao relento. Antonio não cabia no meu Mini 850cc que eu puxava a carreta. Foi encostar-se ao trailer de algum piloto. Não o vira mais aquela noite. Eu pensava nas duzentas e poucas libras que gastara do meu bolso para botar aquele espantalho de pé e assim mesmo visivelmente "naufragante" a estibordo. Eu havia compensado o máximo possível nas molas o aspecto visual, mas o que me interessava era equalizar o peso diagonal do chassi torto para poder fazer o máximo uso dos estabilizadores regulados na proporção do empeno do chassi. Antônio sabia que isso além de difícil só pode ser feito com pelo menos duas pessoas que conheçam muito bem o assunto num piso nivelado à zero. Antônio era alto para as proporções de trabalho num monoposto e estava com as costas em frangalhos da noite mal dormida. De repente deu um chilique e me interpelou a ir num bar comer alguma coisa e pensar. Pensar e resmungava. Fiquei olhando para os "olhões" verdes avermelhados e achei que o Antônio estava com setenta anos. Finalmente entendi que ele queria que o "Turco" fdp coçasse os bolsos e se entregasse a Edesia num banquete de "fish & ships"...Fomos a um boteco in Inglês depois que nos asseguramos que nossa série de treino seria a partir das 14:00 por trinta minutos. Para mim era o suficiente para definir o comportamento do carro. Antônio havia escalonado a caixa de câmbio de acordo com o que havíamos usado na vitória anterior naquela pista e o motor que o Steel nos havia cedido tinha duas corridas e fora revisado. Na Formula Ford aquilo era considerado bom. O problema era do nosso lado, calibrar o chassi, acertar a geometria da suspensão, regular a equivalência das pressões das molas, ajustar corretamente a melhor altura de chassi ao solo e corrigir milimetricamente a posição da caixa de direção para ter um Ackermann com mais ou menos 3% de variação de roda a roda interna para 15 externa a cada 5 graus de convergência. Isso me dava condição de determinar a convergência ideal que eu determinaria para aquela pista, temperatura e a crucial oleosidade do asfalto. Esse treino se dava no Sábado em horário idêntico ao da corrida no Domingo. Em princípio as condições deveriam se repetir. Antônio me martelava essa informação a cada meia hora. Ele sabia que eu usava pressão de pneus completamente diferente da maioria dos pilotos e isso era visível nas fotos frontais em saída de curva. 
A Fórmula Vê com seu eixo rígido dianteiro e seu sistema crítico do sistema direção baseado na caixa de setor e sem fim tinha sido uma escola de acerto de carro imbatível. Nos idos dos anos 66 a 68 eu havia captado um pouco do gênio de Dr. Porsche no desenho daquele sistema de direção no VW Fusca onde ele genialmente compensara a recomendação Ackermann de sua época com uma variação nos pontos de fixação defasada dos terminais de direção no braço Pittman. Até 22 graus e sem offset positivo a eficiência do sistema era indiscutível. Passando desse ponto o carro não faz curva e tende a fincar a frente ao solo e capotar especialmente se o "envenenador" de suspensão resolver botar camber negativo nas rodas dianteiras. Mas 22 graus de esterço já é pedir saudades de casa antecipadas. Alguma besteira terá sido feita para exigir uma correção dessa grandeza. 
A curva Sul do final da reta do Autódromo do Rio na época da Formula Vê era um divisor absoluto entre pilotos e vitórias. A Um e a Dois, embutidas na velocidade em Interlagos era mais crítica, mas permitia alguma correção. A curva Sul do Rio era pé a pleno no final do curso do acelerador cravando 146 quilômetros por hora sem mexer o calçado na pressão do acelerador. Era uma tangência, escorregamento de traseira a mais ou menos 6 a 8 graus e controle até o cascalho onde começava a meia reta. Andando atrás do Emerson ou do Moco a um metro de distância, especialmente o Emerson, era impressionante. Era impressionante ver aquela traseira navegando tal qual um barco a deriva e retornado ao ponto de prumo. Bem ao final da Sul logo adiante podia se fazer uma suave correção para não perder giro. Isso tudo em cima de pneus radiais Cinturato de 4 1/2 polegadas de tala centrado. Era uma escola. Adiante se revelou um passaporte em muitas pistas especialmente em Spa-Francorchamps a de apavorantes 14,300 metros. Aliviando o mínimo o acelerador era ver três carros voarem a sua frente. A Formula Vê foi um exercício de controle completo imbatível porque era totalmente deficiente. Tudo era errado naquele monoposto, tudo tinha que ser improvisado desde a alma do motor até a criação de ajustes próprios ao modelo de condução do piloto. Dificilmente você conseguia dirigir bem o monoposto de outro piloto. Você podia andar bem, mas nunca de ponta como no seu carro. Era dificílimo testar um Formula Vê para melhorá-lo à condição de outro piloto encontrar satisfação. 
Já nos monopostos Formula Ford e demais da series que conhecemos isso era possível com muito êxito. No F-Vê, o tipo de suspensão nas curvas, simplesmente...varia em comprimento o entre eixos externo para o interno devido ao sistema da suspensão dianteira...

À distância e de barriga quase cheia, os olhos do Antônio voltaram a brilhar mais e ele até se permitiu comentar que o "carrito era um pouco bonitinho" olhando de longe. Um comentário luso onde incluiu "olhando de longe"... Olhando de longe é que destruiu o elogio, mas isso estava alguns furos acima da cabeça paramétrica do Português. Cinza não era nem preto nem branco e isso gerava enorme discussão o tempo todo entre nós dois. Trocávamos nomes interessantes um ao outro, mas no final nenhum colou. Ficou a imagem de um tempo quase heroico que lembra um pouco o estado de guerra. Você comenta mais sobre o tiro que não te acertou. No final das contas, Antônio era literalmente um segundo piloto dentro do carro tal a vivência e empenho que dedicou sempre, em todos os detalhes. Antônio Ferreirinha compartilhava integralmente dores e risos. Era uma segurança ao seu lado. Especialmente depois daquela pancada em Oulton Park. Mas nunca deixamos de brigar e muito. E só não o fazemos hoje porque estamos por enquanto...distante apenas 400 quilômetros, caso contrário...


Antonio e Ricardo...

Quando liberaram o acesso ao curral de entrada para a pista Antonio estava de pé ao lado do carro. Foram dez minutos de espera em que não trocamos uma palavra. Antonio sabia que eu ia entrar na pista e em três ou quatro voltas iria parar e lhe passar instruções de acerto do carro. 
Na quarta volta eu entrei nos boxes e parei na altura do boxe do nosso carro. Pedi para o Antonio um ajuste de estabilizadores e pedi que me colocasse no quadro somente a diferença do meu tempo para o primeiro colocado de duas em duas voltas para dar tempo a Paula cronometrar e passar a diferença para o Antonio publicar.
Ao longo de aproximadamente vinte voltas eu sabia que podia rodar mais outras vinte dentro do tempo de treino oficial, mas eu sabia também que estava chegando ao limite da escultura mínima dos pneus dianteiros. Eu não tinha nenhuma roda de reseva. Meu tempo estava entre os cinco melhores e o Antonio dava cambalhotas do box. Eu senti o cheiro de uma luta merecida. Resolvi parar no box terminar o meu treino. Precisava apenas sentir imediatamente a temperatura dos pneus e rolar os dedos sem luvas sobre a borracha. Coisas que um piloto brasileiro tinha que saber fazer e entender o que se passava. Não tínhamos pirômetro. Eles já existiam, mas nas equipes e universos acima do meu. Tudo dependia agora da minha leitura da borracha dos pneus. Antônio sabia disso e sabia que dessa leitura nos teríamos algumas hora de trabalho pelo resto do dia.
Pela manhã de domingo, enquanto nos ajustávamos no box, tem sempre, mas sempre algo mais a fazer, havíamos recebido o número designado do carro e tinha que trocar o numero cinco que estava afixado na carroceria emprestada, por outro. Nisto chegaram o Carlos Alberto Scorzzelli e o Marcos Sacoman. O primeiro era o piloto de Brasília que havia trazido para o Rio de Janeiro o primeiro Formula Ford da Inglaterra para se divertir uma vez que não havia a categoria no Brasil. Naquela oportunidade ele convidara muitos pilotos para compartilhar o prazer de dirigir um monoposto FIA. Foi uma festa geral no Autódromo do Rio e todos ficaram impressionados com a potência do motor 1600 Cortina. O monoposto era pelo menos trinta por cento mais veloz e eficiente em todos os aspectos do que o Formula Vê. No final dos treinos ele me chamou de lado e 
me disse: "cara, eu não ví ninguém sentar e andar de primeira nesse carro do jeito que você fez. Você precisa arrumar uma forma de ir para a Inglaterra porque você vai se dar bem por la". Foi uma mensagem de força. Hoje estava ele lá enrolado no seu casacão me perguntando: - perdeu mesmo o carro novo la em Oulton Park?. Informei que havia de fato perdido, mas que pedaços dele estavam incorporando a esse carro que eu treinei. Ficamos num dialogo de perguntas se eu tinha alguma possibilidade e como havia surgido esse carro no meio de toda a história. O Marcos Sacoman ficou ouvindo com aquele sorrisinho indecifrável, ele que é reputado e de fato conhece muito sobre automóveis quer seja de competição ou um sedan antigo, o homem é fera com uma vida dedicada ao assunto. Recebi muito abraços e desejos de boa sorte e promessa de presença bem como torcendo pelo sucesso. Era a minha presença de torcida brasileira naquele fim de semana.
Quando chegou o nosso horário de apresentação para a inspeção, Antonio e eu rolamos o carro até o galpão de lona de inspeção. Os quatro inspetores examinaram o carro e finalmente um deles informou que os pneus traseiros estavam com a escultura abaixo da "milimetragem" permitida e que fossemos ao stand da Firestone comprar dois pneus. Retornado ao box eu me virei para o Antonio e lhe disse e agora que fazemos. O Antonio me disse, deixa-me dar uma volta e ver se conseguimos uma solução. Passado algum tempo ele retorna rolando um par de pneus montados em rodas. Perguntei qual era a jogada e ele me disse que não havia nenhuma. O Ed Patrick estava atrás de nós e se inteirou do assunto e ao passar pelo box dele me perguntou se eu estava precisando de pneus. Confirmei e ele me disse pode levar esse par e depois da corrida me devolve. 

O Antonio lhe perguntou: mas você não está inscrito nessa corrida? No que o Ed respondeu: estou nesta e nas duas da turista e de GT.
- E ai como é que fica?
Ed respondeu: - Não fica cara. Esse sujeito não pode ficar fora da corrida depois de ter ficado entre os cinco melhores tempos ontem a tarde com essa tranqueira. Afinal de onde veio esse carro? Esse carro é homologado senão não teria passado na inspeção. Eu vi a placa de chassi. É um Merlyn velho?
Bota velho nisso - disse-lhe Antonio, mas tem uns cacos do MK11A destruído em Oulton Park. Parece que é um MK7 II 63.
- O da parede lá do Selwyn?
- Acho que sim.
- Porra, e ele rodou entre os cinco? O Selwyn tá louco. Já imaginou? O carro é de 1963, tem cinco anos de uso cara e é o modelo dos estabilizadores invertidos? Como é que passou o cano de descarga pelos estabilizadores?
- Você não notou, mas conseguimos um par dos MK11A e eu adaptei.
Bem, boa sorte mesmo. Essa eu quero assistir mesmo correndo....disse rindo.
Pois é: Diga a palavra mágica na Inglaterra. - HELP!
Meses antes, naquela tarde em Snetterton a pista estava vazia. Stirling Moss tinha conseguido um favor do Jim Russell para que os dois pilotos novos da SMART - Stirling Moss Automobile Racing Team passassem o dia treinando. Era a primeira vez que iriam andar com os Carros o Luiz Pereira Bueno e Ricardo Achcar. Um dia de primavera razoavelmente quente, estávamos o Luiz e eu a rodar uns tempos razoáveis melhorando a cada acerto que fazíamos nos carro de comum acordo. Nas interpretações mecânicas eu e nas regulagens eu tinha mais experiência do que o Luiz em monopostos. Mas o Luiz era imperativamente intuitivo. Se você soubesse interpretar o que ele informava era informação criteriosa e segura. Luiz media palavras. Nossos corpos tinham hábitos de assentos de competição diferentes, mas juntos somávamos muito. Não tínhamos o Antônio conosco ainda. Não o havíamos importado. O Luiz tinha suas dúvidas advindas de sua longa estada na equipe Willys e era profundamente desconfiado. Mal ou bem, o Antonio era cria desse Carioca e isso era uma novidade um tanto quanto duvidosa para a cabecinha do "Peroba". De fato, ao longo do tempo e muito tranco na equipe, o próprio Antonio reconheceu com o seu total empenho pessoal para ambos os pilotos, o grande valor profissional do Luiz Pereira Bueno, um tremendo piloto que muito pouca gente sabe o quanto arrojado era porque simplesmente ganhava as corridas junto com Bird Clemente e já se haviam para sempre tornado lendas autênticas do esporte motor.
Meses adiante outra vez, eu ainda assistiria o maior duelo de dentro da pista competindo em monoposto que poderia um dia imaginar. Em Brands Hatch naquela tarde de pista repleta e circuito Gran Prix eu havia feito o segundo tempo e Luiz era Pole Position. Collin Vanderwell, neto do potente Lord Vanwall, era a nova fera que surgira tendo adquirido o carro imbatível de Emerson Fittipaldi que já pulara para a F-III. Na largada eu pulei para frente e realmente abri a frente que queria. Adiante entre a terceira e quarta volta eu percebi que perdia para o Luiz na Stirling Bend . Ele conseguia fazer a Strling Bend mais rápido do que eu conseguia e eu me recuperava na Paddock Bend. Acreditei que iria melhorar na Stirling prestando muita atenção e ganharia a prova. Na terceira volta chegando na Paddock Bend e trocando de marchas percebi um 
ligeiro travamento no motor tipo freio motor não solicitado. Minha experiência me dizia que o mancal central do bloco rachara e eu estava perdendo pressão por vibração do virabrequim na altura dos seis mil giros para seis mil e duzentos, limite do motor. 


Brands Hatch - Ricardo, Luiz,Colin...  

motor Cortina tinha um pé de fracasso de engenharia com um virabrequim suportados por três mancais, ambas as castanhas em ferro nodular. Isso era um fator limitador delicado na limitação de giros. De repente, sem mais nem menos os dois me passaram no bacião onde o Jo Siffert perderia a vida anos depois. Era um ponto menos crítico, mas parecido com a junção de Interlagos em termos de transferências de massas. Ao me passarem o Colin emparelhou com o Luiz e eu assisti durante oito voltas, na parte do circuito Gran Prix o que, se tivesse acontecido na área do circuito Club promoveria a ambos a desclassificação. La dentro da floresta escondida e mortal do circuito GP, ambos se bateram roda com roda tirando lascas de ferro e centelhas que chegavam dez metros atrás no meu carro. Eu me dizia, vou ganhar essa corrida e acompanhar um enterro. Foi um momento de minutos indescritíveis de testosterona no pico da morte. 
Finalmente como achei que não se matariam se batendo, eu me liberei mesmo com menos condições de motor, para tentar me encaixar num segundo lugar. Faltando menos de duas voltas eu aproveitei o embate acirrado e quando o Collin abriu para a esquerda em Pilgrim's Drop para ganhar velocidade na curta descida antes de se ajustar na perigosa tomada a direita em subida de media alta Hawtohorn Bend, Luiz abriu junto e rápido para fazer igualmente uma tomada...ninguém iria passa-lo por fora...naquela curva. O Collin estava preparando a desatenção do Luiz no retrovisor para dar o golpe mais adiante. Acontece que o Luiz abriu para tomada junto com ele e...deu um pico de freio um tostão mais prolongado e a água quente do radiador do Collin se enterrou na caixa Hewland do Luiz e água e vapor espirraram e embaçou minha viseira ao que eu tomei o segundo lugar...e o Peroba ganhou a prova.
Falem-me de corridas de automóveis....
O Antônio horas antes pegou o mecânico do Collin no nosso box lambuzando os meus discos de freio dianteiros com óleo de freio. Brilhavam que era uma beleza...Collin era F.
De volta a Snertterton estávamos rodando livremente na pista e aos pouco eu fui parando e ajustando pressão de molas, amortecedores e mais detalhes e íamos Luizinho e eu trocando de carro e trocando ideias. Estávamos ambos tentando tirar o máximo das máquinas e buscando adiante tirar um tempo contra o outro. E assim fomos suando o capacete e o macacão, parando a cada meia hora, reabastecendo e ripando as máquinas. La pelas tantas da tarde vimos, la pelo no inicio das carreiras de box, o Emerson apareceu com seu formula laranja Merlyn e dentro de algum tempo começamos a cruzar os bigodes na pista. Um longo tempo se passou e Luiz e eu estávamos muito melhor do que o Emerson volta após volta. Um dado momento o Rato parou quando nos viu parados no box ajustando alguma coisa e veio ao nosso encontro. - e aí cara, como é que estão as coisas? Perguntou o futuro campeão do mundo.
- Estamos indo bem, estamos ajustando a máquina.
- É cara, eu não consigo acompanhar vocês em saída de curva. Vocês dois dão uma estilingada e se mandam. Qual é o segredo?
Quem conhece o Luiz já sabe que ele fez a tromba e ficou tão calado como educado no seu silêncio total. Aí o metido aqui perguntou: - Mas o que você sente no carro. O que você sente, sai de frente, sai de traseira, em curva de alta, na saída da curva, como é que é?
Emerson retrucou:- Cara eu sinto tudo bem normal na máquina. Não sei o que dizer. Só vi que vocês disparam nas saídas das curvas, na acelerada especialmente saída curva no final da reta.
Aí o metido aqui devolveu: - Traz o carro para junto de nós e vamos olhar na comparação.
O Rato caminhou até o seu box solitário e trouxe o carro laranja até nós.

Passamos a examinar o carro juntos. Emerson é reconhecidamente um acertador de carros com raras qualidades. Examinando no "olho" toda a periferia do carro eu podia assegurar que estava muito bem alinhado. Recapitulando a expressão "saída de curva na acelerada" do Rato eu me dei conta de que ele estava me dizendo que "destracionava" ou sentia ausência de aderência. Um desses dois fatores era o que estava em jogo especialmente no caso dele que era um piloto estrela. Não era possível pensar outra coisa salvo uma rachadura no chassi. Isso se confirmava porque era contra o Luiz ou eu nas mesmas condições disparava a frente dele.
Foi quando então lhe perguntei: - Quanto de pressão você está usando nos pneus? O Rato devolveu:- A pressão que todo mundo usa na Formula Ford. 32 libras nas quatro rodas.

Disse-lhe eu: - Te dá uma tremenda precisão instantânea no volante, certo?
- Absoluto, disse o Rato. Uma faca nas curvas. Fazia referência ao F-Vê com seus Cinturatos que pareciam bochechas de um lado para o outro no asfalto.
Então eu disse ao Emerson,: - Faz o seguinte. Coloca 22 libras na traseira e 18 libras na frente.
Emerson olhou para mim, ficou parado, fixo. A cara suada e o capacete a mão. Tomou tempo. Finalmente me disse.
-Ricardo, eu vou fazer isso porque é você que está me dizendo.
Em seguida, calibrou a receita nos pneus, colocou o capacete, ajustou, sentou no carro se auto colocou o cinto de seis pontos e os ajustou. Tudo sozinho. Não precisava de ajuda. Já tinha o total controle.
E, se foi. O Luizinho e eu, naquele mesmo dia e treino, nunca mais vimos o furo da bala.
Que piloto e que motor...
Luiz nunca me perdoou. 
Eu acho que de fato nunca entendi a regra do jogo.
Naquele Domingo o programa anunciava a nova inspeção e classificação - 20 minutos - para a categoria Formula Ford competindo no Les Leston Championship para as 11:00 horas da manhã.
Passamos bem pela inspeção com o Ed Patrick sacaneando o Antonio se ele precisava também de um volante. Depois, olhando mais para o carro identificou seus pneus mais raiados e novos dos que os meus remanescentes na traseira, colocados no trem dianteiro do carro. Ed ainda perguntou para o Antonio se não havia algum engano naquele ajuste, no que o Antonio com dificuldade de entrar em detalhes apontou para mim. Nisso o Ed concordou levantando os braços. 
Fomos direcionados para o "curral" de entrada na pista onde ficamos aguardando para todos entrarem juntos. Uma vez liberados entrei na pista e sem esperar mais nada fiz cinco voltas e cravei o terceiro tempo da classificação. Luiz Pereira Bueno se classificou no segundo lugar para 
a satisfação da equipe do Stirling Moss a S.M.A.R.T.



Dada a largada eu pulei para a primeira posição na segunda volta e despenquei até o final ganhando a prova. Creio que o Luiz ficou em terceiro nessa prova e já não me recordo mais quem foi segundo e os demais. 
Meu segredo foi estabilizar a frente do carro de tal maneira que deslizasse sobre os pneus mais raiados com os amortecedores ajustados para macio de maneira a ganhar o máximo de aderência "com aviso" de escape. Quando desse sinal de escorregar eu teria o trem traseiro muito bem estabilizado e duro em relação a frente e poderia "tesourar" o volante buscando um traçado mais amplo e com tangências mais afastadas da corda da curva mas com aceleração plena mais constante. Ganhei velocidade para aquela combinação, naquela pista, em pontos específicos, temperatura e piso. Recentemente observei o Alonso fazer uma mudança de traçado relacionada com uma troca de pneus e valores de reação tão evidente que fiquei impressionado com a capacidade de interpretar uma modificação desta natureza num F-1 com pneus tão críticos e instáveis, com aerodinâmica impossível de interpretar porque vento não faz curva... e de, sobretudo sem ter informação direta do carro para o piloto que literalmente não "sente" nada. Dependendo de sensores, telemetria, interpretações de engenheiros que não são pilotos como um Chapman foi em sua época ou o Tri Brabham. Aliás, este é um detalhe impressionante no formato de pilotagem do Alonso. Vocês já repararam que a engenharia do Alonso fala pouco? Informa mais do que comanda? 
Lembro-me de minha torcida nacional local ser explosiva naquele dia. Mas muitos ingleses presentes foram mais do que cordiais e havia um clima de gozo relacionado ao carro. Foi uma corrida a não se esquecer, e eu não sei onde Antonio e eu encontramos soluções, vontade e até mesmo um excesso de ousadia diante de tanta adversidade que nos acompanhava desde o acidente em Oulton Park. 
Muita coisa iria ainda rolar e algumas impagáveis como o teste de desenvolvimento da Lola T 210 com o presidente Erick Broadley na pista de Brands Hatch alguns meses depois.
Mas...isso é uma outra história.



Enfim, tudo isso para contar esse final que em minha opinião vale um filme comédia.
Terça-feira seguindo o fim de semana heroico me telefona o Chris Steel para o hotel Trevose. 
- Onde você anda?
- Ainda de porre, porque? 
-Tem algum teste na quarta? 
-Quarta-feira era o dia que o John Webb estipulava para treinos livres ou testes com pagamento mínimo de uso da pista em Brands Hatch. Já era tradicional.
- Que teste nada! O Selwyn Hayward está em pânico. 
- Como em Pânico? O carro está na tua oficina. Qual o problema?
- Você foi se meter a ganhar a corrida!
- Como é que é?
-Você ganhou a porra da corrida!
Ai eu fiquei meio que mudo. Inglês às vezes era uma língua difícil de acompanhar.
Retruquei: - Não. Eu ganhei a corrida. Cheguei em primeiro lugar.
- Mas porra está claro que ganhou. Já detonou esse assunto na associação dos fofoqueiros da imprensa da fofoca.
- Mas e então?
- Mas não era.
-Mas não era o que?
-Porra não podia ganhar. Era para dar uma presença. Aparecer. Não ficar "morto". Será que você não entende?
Realmente eu tinha dificuldade em entender. 
Anos mais tarde, quando virei construtor de carros de corrida e com o exponencial evento da Formula Super Vê profissionalmente calçada pela Volkswagen do Brasil durante a presidência do inesquecível Wolfgang Sauer, lembrando este assunto bem ainda a flor da pele, recordo de uma fato muito interessante.
A Polar Racing Enterprises estava no auge de suas vitórias na Super Vê e evidentemente muitos pilotos trocavam os carros por um Polar Super Vê. Era o carro que melhor assegurava vitórias. Lá em Maria da Graça, no Rio de Janeiro, onde ficava a fábrica nos seus anos mais importantes, um dia eu me virei para o Ronaldo Rossi que era o meu sócio na empresa e para o Chico Lameirão que era a viga que completava e lhes disse. 
- Pessoal, vamos fazer outro carro nesse galpão que está para alugar aí em frente?
Estabeleceu-se um profundo silêncio na sala de projeto.
O Marcos Carbone que era o projetista enterrou a cabeça na prancheta e se fundiu com ela. O Rossi começou a sacudir os braços e as pernas, ficava sempre de pé da altura dos seus 1,92 centímetros que nem vara de pesca trepidando. O Chico, bem Português, entrou em transe, suas meninges interpretavam "coisas" que só o Chico sabe enxergar e não saia uma palavra da boca.
Fomos todos salvos pelo Ed Moina.
Ed Moina é um capítulo a parte na minha vida. Uruguaio de nascença tinha um senso de humor e um vigor na caneta ao desenhar que fazia dele um ser dimensionalmente a parte. Era o computador da época... Era uma criatura universal. Via tudo cor de rosa, ou colocava tudo na cor de rosas. Tinha um senso de humor que transcendia anedota. Era fulminantemente interpretativo por natureza. O Buggy Terral era desenho dele. A Esquadrilha da Fumaça da FAB portava as cores e design do Ed Moina. 
Em trinta segundos rabiscou numa folha de desenho um cavalo cavalgado por um cavaleiro em três direções. Levantou a folha no meio da sala de projetos e com seu sotaque marcante, expondo a obra e disse:
- "Pronto, monto em su brioso corcel e se partiu em todas las direcciones".
Foi risada geral, mas...Creio que naquele dia e hora foi o momento na minha vida em que eu mais me encontrei. Nunca esqueci as palavras jocosas do Ed Moina, mas também nunca pude deixar de enxergar uma verdade completa naquela sua interpretação. Essa marca tem tanta dinâmica quanto ...peso. A vida me contou.
Fato é que o Chico logo se recuperou e embarcou na ideia. O Rossi era mais difícil, mais pragmático e dizem que isso é ser mais realista. Acabamos de certa forma contribuindo para liquidar a categoria. Ganhamos tudo. Isso não é bom para o esporte motor. Tipo monomarca. MORTAL.
Voltando ao telefone púbico da pensão Hotel Trevose... me reportei ao pânico daquele telefonema que terminou mais ou menos da seguinte forma.
- Olha - disse  Chris - O homem quer o que é parte dele desse carro maldito la em Colchester ontem.
- Mas porque esse pânico?
- Cara, o homem tem uma produção de 40 carros mês e você arruma um jeito desconcertante de ganhar uma prova com um carro velho de cinco anos, capenga e com inscrição independente no meio de um campeonato Inglês?
- Mas o que você realmente esperava?
- Realmente, sobretudo esperava que você nunca ganhasse a prova.
- Mas cara: ganhei com o seu motor!
- Cala essa sua boca, homem. Eu tenho uma produção contratada de fornecimento de motores para a fábrica dele há mais de três anos! Você não entende? Já imaginou acharem que um motor Steel correu fora do regulamento, por exemplo?
De fato levei tempo para entender toda a situação.
Afinal, um carro parcial velho de cinco anos. Empenado. Montado por um Português e um Brasileiro no fundo de uma oficina, usando um motor em bom estado usado, com pneus deficientes e sem treino algum de pista para ajustes, era uma caso razoavelmente singular.
O que me escapava e que eu viria entender alguns anos depois na pele de construtor é o que se passa no interpretativo da imprensa, chefes de equipe, pilotos, mecânicos, patrocinadores. Passam-se interpretações que nada tem a ver com o projeto de um carro de corridas e que este pode cair em desuso e desqualificação junto a patrocinadores numa ocorrência como essa, que para mim, foi fruto de grande felicidade.
Finalmente:
- Pelo amor de Deus, se manda para cá com o Antônio e desmonta esse troço que o Pete vai levar amanhã à tarde sem falta para Colchester. 
O homem está em pânico e quer pendurar o chassi na parede o mais rápido possível. 
Esse carro que nunca correu em Mallory Park em 1969. Está claro? Nunca correu. Esse carro. Está claro? E já devolveu as rodas do Ed Patrick? Foi ele que botou a boca no telefone às gargalhadas às oito da manhã para o Selwyn. Você imagina isso?
- Claríssimo, respondi, botando a viola no saco.
O Antonio teve convulsões. Esperneava com razão. Metade do "lucro" era dele. Levou muito tempo para entender. Muito. O Chris correu sérios riscos na época.
Menos esbaforido e acalmado com minha resposta, Chris retornou: - Umbelievable! How could you do this? (como pode fazer isso?).
- Pude fazer com ajuda do Chris Steel, Peter Hull, Antonio Ferreirinha, Ed Patrick, Carlos Alberto Scorzelli, Marcos Sacoman e finalmente, que Deus o tenha, o grande Selwyn Hayward cujos carros brilham ainda hoje sem previsão de ser vencido pelo tempo.
Mas que foi hilário isso foi! 
A melhor corrida, gente: nunca é.
O que é, é o micro universo por aonde a equipe, os agregados, os torcedores, o cheiro da borracha, gasolina verde, o cachorro quente e... a ilusão da vitória definitiva que nunca chega. A Melhor Corrida, nunca chega. Só chega à categoria fúnebre da monomarca aonde salvo o marketing do fabricante, ninguém vai para lado algum, que não faz história, não deixa saudades e cimenta de maneira constrangedora o sentido de esquecimento. Pior do que página virada é a página em branco. Como competir na real nestas condições em busca da grande acalentadora ilusão, a Melhor Corrida?


A Mola mestra que nos leva ao desafio de competir. Selwyn Hayward MK 7 F II 63/64 que foi pilotado por Teddy Pillete...

Ricardo Achcar

Do fundo de um baú sem fim...

Março 2013

Fotos: 
1- Abrindo frente sobre o Emerson Fittipladi em 1970, Torneio internacional BUA - Rio de Janeiro, Lola T210 X Lotus FF /
2 - Chris Steel e Vitória em Mallory Park, campeonato Ingles -/
3- Selwyn, jovem na Merlyn / 
4- Fábrica da Merlyn na ação que seria a Polar um dia....qual fumaça num Brasil que sempre 
tudo se evapora / 
5 - Oficinas do Chris Steele e quebra pau / 
6 -Perda do Merlyn MK11A em Oulton Park / 
7- A Mula no sábado....e depois no curral para classificação/ 
8 - A Mula tomando pau na inspeção.../
9 - O Dia do Duelo narrado de Brands Hatch, eu largo e tomo a ponta , Luiz em 3º e Collin em 4º / 10 - Snetterton dia livre de treino / 11 - Alinhado para partida com Antonio ao lado...envergado ao solo / 
12 -A caminho das nuvens....bem próximo do céu dos pilotos./ 
13 - Selwyn Haward, muito obrigado.


2012 no encontro do Julio Caio