No primeiro treino na
quinta-feira, o pesadelo começa com Jochen virando cinco segundos mais lento
que a Ferrari de Jacky Ickx.
Miles pára nos boxes
enquanto o carro de Jochen é desmontado.
Pelos seus semblantes,
era de se pressupor que as coisas não iam bem.
Desde pequeno, mais
precisamente aos três anos de idade pelos idos de 1981, tive meu primeiro
contato com a F1. Por intermédio do meu pai, um fã declarado de Nelson Piquet e
Stirling Moss, pude descobrir esse mundo fantástico e fui completamente
contaminado por esse vírus! Gostava muito do Nelson e tinha um carinho especial
por Gilles Villeneuve, tendo o GP do Canadá de 1981 ainda vivo em minha mente e
lembrando como se fosse ontem, quando minha mãe veio até o quintal onde
brincávamos, me dar a triste notícia naquele fatídico 8 de maio de 1982.
Pois o tempo passou,
Nelson foi bicampeão e o garoto agora aos sete anos, aprende a ler e descobre
uma nova paixão: Ficar horas e horas com coleções de revistas antigas
especializadas espalhadas pelo carpete do quarto em uma viagem incrível no
tempo, contemplando fatos e mergulhando de cabeça na história da F1! Pois em
uma dessas ocasiões, lendo uma Autoesporte de 1973 que trazia uma reportagem
sobre todos os campeões mundiais, tive meu primeiro contato com Jochen Rindt. O
texto trazia o seguinte título: Jochen Rindt (1942-1970), campeão do mundo
(1970). Imaginem para um garoto de sete anos compreender como um piloto poderia
ter ganho um campeonato post-mortem e dali em diante surgiram diversas
interrogações em minha mente e eu me perguntava mas como? Ele estava em seu
melhor momento e simplesmente deixa esse plano e fãs que o idolatram de uma
forma estúpida e violenta, seguindo imposição de um chefe de equipe que só se
importava com o sucesso, deixando a integridade dos seus pilotos em segundo
plano! Mais adiante um pouco, assisti pela primeira vez o filme "O
fabuloso Fittipaldi" e tive contato com as cenas do acidente. No mesmo
tempo já com nove anos, fui a um sebo e adquiri o exemplar número 123 da
revista Quatro Rodas (outubro de 1970), que tinha as fotos e reportagem do
acidente com o depoimento do Emerson. Apesar de meus pais e tios possuírem
diversos exemplares, eles não tinham as coleções completas. A partir de então
eu quis saber tudo sobre sua vida, a infância, o início nas competições e a
carreira em outras categorias, pois Jochen era polivalente, corria de tudo
quanto era tipo de carro! Apesar de algumas reportagens veiculadas na época
dizerem que ele era arrogante, não era isso que se via e nas suas apresentações
do programa Motorama da ORF, o que se podia pressupor era que ele era um tanto
tímido e introvertido, mas seu estilo um tanto despreocupado arrastava milhares
de fãs onde quer que houvesse uma corrida! Jochen era um gentleman, todos os
pilotos gostavam e era de fácil comunicação, muitas vezes trocava gentilezas
dentro das pistas. Ele as vezes exagerava e quando indagado se iria deixar as
pistas no fim do ano, ele disse: "Agora que já sou quase campeão mundial?
Estou pronto para a morte"!
Com o chefe dos
mecânicos Eddie Dennis, tentando achar alguma solução para o fraco desempenho
do carro.
Últimas fotos na tarde
de sábado, antes de sua derradeira saída dos boxes.
Agora vamos viajar no
tempo para exatos 50 anos atrás, a primeira semana de setembro que era ocasião
do GP da Itália de F1. A Lotus apesar de ter feito a pole position na Áustria,
se deparou com uma Ferrari muito forte e sabiam que em Monza que na época era
quase a volta toda "flat", as coisas só iriam piorar! O que eles não
contavam é que o carro simplesmente não andou com o aerofólio no lugar, tendo
Jochen virado em ridículos 1'29" no treino de quinta-feira! Na sexta-feira
no início do treino, Jacky Ickx da Ferrari pulveriza todos os recordes e marca
impressionantes 1'24"14, que seria o tempo definitivo do final de semana.
Chapman resolveu tirar tudo e deixar o 72 pelado, sem qualquer adorno
aerodinâmico. Já nas primeiras voltas Jochen reclamava que o carro pendulava em
plena reta, tanto que Miles nem quis mais sair, por medo que algo acontecesse.
Pouco depois Emerson se distrai e bate o terceiro carro da equipe, sem maiores
consequências. No final do treino o saldo era completamente decepcionante, com
ele alcançando 1'25"71 em sua melhor passagem e ficando com a sexta
colocação, a mais de 1,5 segundo da Ferrari. E tudo isso sem poder confiar no
carro, muito sensível as rajadas de vento e extremamente perigoso! Esse tempo
lhe daria apenas a décima segunda colocação nos tempos combinados e eles não
sabiam mais onde melhorar. Foi quando Jochen sugeriu que trouxessem um Lotus
49, carro que ele havia feito a pole position no ano anterior e que se
comportava perfeitamente sem o aerofólio. A idéia foi vetada por Chapman que
não queria mais ter que recorrer ao carro antigo.
Eddie Dennis faz a
última checagem.
Na volta anterior ao
acidente.
No sábado pela manhã em uma
conversa com Emerson, propõe a este que passe a comandar seu show na F2 e que
se ele aceitasse, se chamaria "Jochen Rindt-Fittipaldi Show". No
primeiro treino a tarde, saiu para tentar tudo em algumas voltas e segundo
Denis Hulme que fora ultrapassado por ele um pouco antes do acidente, estava
muito veloz! Hulme conta que o carro pendulava como de praxe e próximo a entrada
da curva na área de frenagem, dá uma forte guinada para a direita e na
tentativa de corrigir é jogado com violencia para o guard rail do lado oposto.
O impacto é tão forte que toda a seção frontal do carro é arrancada na altura
do painel e ele sofre um traumatismo torácico.
Jochen desce a reta que
leva à curva Parabólica, nessa que seria a última foto antes do acidente.
Jochen tenta corrigir o
carro fora de controle e é jogado com violência contra o guard-rail.
O fiscal corre
assustado quando o carro pára. Jochen está inerte com suas pernas a mostra,
antecipando o que todos já esperavam.
Em seguida o carro roda
violentamente com força para trás, jogando-o para dentro do cockpit, com o
cinto sem o quinto ponto cortando-lhe a traquéia. Quando o carro parou e os
médicos e fiscais chegaram, pouco havia a se fazer e mesmo assim ele ainda teve
a explosão da aorta, em uma infeliz massagem cardíaca. Foi colocado em uma
ambulância e levado já sem vida para o hospital em Milão e tudo porque pelas
leis italianas se um piloto morresse na pista, a mesma teria que ser
interditada impossibilitando a realização da corrida. Enquanto Stewart tentava
confortar Nina, esposa de Jochen e lhe passar a notícia, Chapman rapidamente
recolhe tudo e deixa a Itália, com receio dos problemas que enfrentaria com a
justiça, pois desde então já se sabia que o motivo teria sido uma falha
mecânica. Stewart chocado não consegue falar aos repórteres e o mundo
simplesmente desaba para aquele que chegava a Monza como eminente campeão
mundial e que nem precisava de tantos esforços para alcançar a tão sonhada glória!
No seu velório em Graz, no dia 11 de setembro, Joakim Bonnier é o mestre de
cerimônia e diante de uma Nina com muitas olheiras e visivelmente abatida, cita
Jochen como campeão mundial pouco antes da lápide ser fechada, pondo um fim em
uma era e o alçando para sempre aos anais da F1, como único campeão post-mortem
da história! O fato se consumaria em Watkins Glen, quando Jacky Ickx que
precisava vencer as três últimas, não passou de um quarto lugar e não conseguiu
superar a enorme vantagem que Jochen tinha na tabela, ficando a coroa para quem
realmente a merecia!
Stewart dando a notícia
para Nina.
Nina visivelmente
abatida, vai ao funeral do marido.
Graham Hill, seu ex
companheiro de equipe e Jack Brabham seu ex patrão, mostram seus semblantes de tristeza
no funeral.
Nina, Stewart seu
grande amigo e a taça de campeão mundial.
Texto e fotos Marco Zanicotti